01 junho 2008

Pobreza

Nesta época terrível que já estamos a viver, coisa que em toda a minha vida nunca me foi dado ver, nem mesmo durante os ,grandes racionamentos do tempo da segunda Guerra Mundial, há pessoas de um estrato social ao qual nunca atribuiramos a qualificação de pobres-pobresinhos de pedir, que estão agora a recorrer a práticas de sobrevivência que eu julgaria impensáveis para qualquer pessoa, mesmo sabendo que para os tais pobresinhos elas existiam e me confrangiam dolorosamente. Na fase inicial do grande afluxo de imigrantes provenientes do leste europeu, foi-nos mostrado nos noticiários televisivos o degradante espectáculo de filas mais ou menos ordeiras à espera, pela noite, dos caixotes de lixo postos na rua junto às portas traseiras dos grandes supermercados, para neles recolherem tudo o que pudesse servir-lhes para matar a sua fome ou a das suas famílias. Mas eu própria os vi remexendo os pequenos receptáculos para lixo suspensos nos candeeiros de rua e nos caixotes de lixo doméstico . Foram criadas várias instituições de caridade originárias, algumas, de igrejas de religiões não católicas, e outras de simples associações de solidariedade e começou-se a falar muito abertamente dos sem abrigo para os quais estas instituições criaram uma forma de assistência por meio de carrinhas que, pelas noites e madrugadas, se espalham pelas cidades fornecendo comida e há mesmo algumas que funcionam como posto médico rudimentar.E nós, os que não sabiamos como acudir àquelas pessoas, passámos a ter uma forma de o fazer,por interpostas associações. Mas, resultado do nosso cada vez maior conhecimento dos hábitos de outros países da Europa, da nossa cada vez maior europeização, começámos a usar aquele processo de nos vermos livres dos grandes"monos", lixos incómodos, colocando-os em certas zonas da rua demarcadas para esse fim. E é para lá que vão mobiliário, electrodomésticos, plantas secas retiradas de jardins, livros e tapetes velhos ou inúteis e roupas,domésticas ou de vestir. Há entretanto uns dias certos em que a Câmara manda proceder à recolha de tudo isto mas, nos espaços entre estas recolhas, aparece quem venha procurar aqui o que pode aproveitar para si. Já me aconteceu perder algum tempo a observar da minha varanda as aproximações de pessoas a esta livre oferta que se lhes depara inesperadamente quando passam por um destes depósitos de inutilidades. Quando, há poucos anos, esta prática começou a existir, a atitude primeira de incredulidade juntava-se aos olhares perscrutadores em redor e depois a uma avançada rápida e uma retirada ainda mais rápida com qualquer coisa arrebatada do monte,parecia-me, quase sem escolha. Contudo a habituação tem permitido aos aproveitadores um à-vontade sempre crescente nos seus abastecimentos deste tipo. Quando vi que ,vendo o que há, se parte e volta mais tarde com um carro para poder carregar o que se escolheu, deixou de divertir-me como sempre, esta observação, até ao dia,há pouco mais de dois a três meses, em que tive a certeza de que já não era o mesmo "tipo" de pessoas que andava por ali a tentar guardar em sacos que trazia, roupas de criança, malhas e sapatos e até uma ampla toalha que me pareceu de banho...Dizem-me que isto pode ser indicador de mais coisas que não da pobreza envergonhada, mas, quanto a mim, será sempre indicador de uma certa pobreza( talvez moral? ) para acudir à qual eu ainda não sei de nenhuma associação de caridade...

1 comentário:

Joana disse...

Infelizmente, somos um país pobre, muito pobre, de quase tudo... Essa "nova" pobreza a que alude, olhe... sinais dos tempos.

Jinhos.