29 abril 2010

Sobre o Domingo do Bom Pastor

Criado que foi o hábito de deixar em post as minhas meditações sobre todas as Leituras próprias de cada Domingo, qual não é a minha perplexidade quando, falhando uma vez, me chegam reclamações pela falha...
Ora no último domingo, que era precisamente devotado ao Bom Pastor, aconteceu que fiquei sem ligação à net e consequentemente não me foi possível cumprir com esta já quase obrigação.
Escusado será dizer que não fiz texto algum nesse dia, mas ,entre muita leitura que fui buscar nesse a-propósito, reli um pequeno poema que ofereci ao meu Prior para, junto com outros textos de outros paroquianos, celebrarmos os seus ciquenta anos de sacerdócio , de Bom Pastor a exemplo de Jesus. De lá retiro uma passagem , esperando que me seja perdoado este pequeno roubo.
...E havia o rebanho. E há as suas ovelhas..
Pastor, como se diz de Jesus, no Evangelho,
dá, por sua vontade, a sua Vida
pela Vida delas, e as salvará.
E o Amor que lhes dá
é o que elas seguem.
Porque o reconhecem
por algo bem maior que a sua Voz !

Bom será recordar-se o Evangelho de São João, 10

28 abril 2010

Abril

Depois de ter-me visto privada do acesso`a internet durante todo um fim de semana alargado,é agora com uma certa volúpia (só conhecida pelos que dela se servem) que retomo a minha posição de bloguista (blogueira ? ). Empregando uma figura um tanto desairosa, direi que, à maneira de um pacífico ruminante, degluti uma substancial massa de assuntos que precisam absolutamente de ser regurgitados para adquirirem o real valor nutricional de que carece o equilíbrio das minhas sinestesias.
Este meteorologicamente extraordinário mês de Abril foi, como todos os outros, no capítulo das efemérides:todos os meus amigos fazem anos neste mês, e familiares mais próximos ou mais afastados, já falecidos uns, outros não. Sendo que o falecimento do meu marido foi neste mês, é a sua recordação de cada dia comum, avivada e elevada à máxima potência nesta época, por alguma razão que já desisti de encontrar. Instala-se uma mágoa que não é igual a mais nenhuma, e pronto!, todo o mês de Abril anda pelas margens desta fundura. Assim, é-me preciso fazer um esforço enorme para não me distrair de todo o resto.1, 4,7,8, 10, 12, 17,19, 21, 22, 23,27..., datas com pessoas que não posso, nem quero deixar de celebrar,umas porque estão vivas, outras porque já partiram e delas nos ficaram as saudades.
E pelos interstícios de tanta data surgiram os acontecimentos ocasionais que vão sempre quebrando as rotinas das maneiras mais inesperadas. Apareceu-me, por exemplo um novo membro daquela família artificial que eu tive, por via da minha madrasta que foi minha Mãe, desde os meus cinco anos. Uma jovem artista, desde há muito radicada em Nova York e que vem expondo as suas instalações em muitos mundos, mesmo orientais, preocupados com a Terra e com o que misteriosamente nós, humanos, herdamos dela enquanto nos fragmentamos em mil partes, na procura da sobrevivência talvez demasiado erradicados e urbanos. Foi um enorme prazer este encontro tão simples e descomprometido com alguém que tão bem sabe interpretar a nossa realidade tão complexa e comprometida...
Comprometida sim com as coisas grandes como a vinda do Papa e com as coisas ridículas como a guerra das nossas empregadas domésticas que consegue abalar a nossa estabilidade e exige um esforço suplementar no recurso às habituais doses
de bom senso para cada coisa, cada dia...Da vinda do Papa, por enquanto, este Abril-hall de entrada da nossa preparação receosa, mostrou-nos sobejos motivos de preocupação que ainda não me deixaram sentir o coração grande dentro do peito, como aconteceu aquando da visita de João Paulo II. Veremos depois se algo encaixa nas fragmentações de que se ocupa a minha nova Prima...
E houve a Música ! A Grande e a outra. Dizer que estive ao pé dela, a ver a gente que a ia ouvir e que eu me fiquei pelo estar perto daquilo que me encanta enquanto fui imaginando aquilo que ainda não conhecia...Explica-se mas, por agora, basta-me dizer que foi a Música assim como foi o 25 de Abril.
Estive. Em corpo e espírito. Mais em espírito. E acho que foi como eu queria que fosse.Porque fui EU que estive inteira com todas as forças que ainda vou tendo para amar, por cima de amar, por cima de amar, por cima de amar, assim mesmo,em camadas de Vida sempre nova e agradecendo-A a Deus em cada novo ABRIL.

17 abril 2010

Pela terceira vez...

Pela terceira vez Jesus está junto daqueles que tanto conviveram e partilharam com Ele e pela terceira vez eles não reconhecem aquela aparência física... Apenas um pequeno gesto, um pequeno tom, um quase nada a que um deles é mais sensível que os outros, lhes vai abrir o caminho da revelação...Homens simples,ainda não pescadores de almas como fora prometido a Pedro, eles já iam sendo temidos por muito falarem publicamente da sua confiança, mais que confiança : crença, admiração, fé, naquele que havia sido crucificado tão cruelmente e já começavam a ser açoitados e escorraçados para não incomodarem tanto... Era o princípio.

Eram pois aqueles encontros que podiam fortalecê-los. O seu Amigo, o seu Irmão, não os deixava sós, como aliás prometera. Apenas era preciso que o reconhecessem, que o soubessem encontrar. Ele sempre estava por perto...

Isto não terá nada a ver comigo ? Conosco ?
Quando aquele Companheiro da refeição comida na praia pergunta por três vezes a Pedro uma confirmação do seu amor, era enorme a sua preocupação sobre se poderia confiar-nos a nós,ovelhas do seu rebanho, a quem fosse capaz de fazer por nós o que Ele tinha feito. Receava a humana fraqueza, até a que vem pelo cansaço do envelhecimento... Humanos, nós, andaremos conscientes de quanto cuidado amoroso nos continua envolvendo ?

14 abril 2010

CAFÉ

É bem verdade que se aprende durante toda a vida.
Acabo de saber que hoje é nem mais nem menos do que o DIA INTERNACIONAL DO CAFÉ.Oh pasmo ! Oh imaginação criadora de todas as globalidades ! Oh divindade protectora de todas as artes de vender !... Então eu, que sou a grande amiga do cafézinho , vivi todos estes anos da minha vida sem saber de tão glorioso dia comemorativo ? Mas como é possível?
E onde e como e porquê teria nascido esta ideia? No Brasil, em Timor, em São Tomé? Numa esplanada de Paris ao aroma do velho café-filtre ? Na Holanda, na Turquia ? Mil e uma possibilidades para uma HISTÓRIA que eu quererei conhecer.
Apenas,pelo há muito que o amo, e pelo conforto e aconchego que ele já me proporcionou tantas vezes, me inspirei, em tempos, fazendo para ele este poeminha que hoje acho que posso, que devo, dedicar-lhe como homenagem em dia próprio :

Da cháven pequena, torneada,
evola-se o perfume...
...um quase nada
a deixar-nos na boca
um travo quente-amargo,
um azedume
um pouco adstringente
que ao culto iniciático
nos prende.

Devagarinho, muito devagar,
vai-se bebericando,
entre a volúpia do saborear
e a sedução do que se está cheirando.

E quer-se companhia.
E apetece falar
tão molemente
como o deixar escoar
co'o tempo a fantasia
e nem se aperceber
que, aos poucos, arrefece...

Mas se acontece
beber-se de um só trago,
em correria,
porque se é distraído
e é pressa que se tem,
pode reconfortar,
pode mesmo aquecer...

O que porém
não vai deixar de ser,
é uma imperdoável
heresia !...

11 abril 2010

Ver para crer...ou já não?

E uma curiosa coincidência que, tendo este meu blog o nome de Sinestesias ( que tem tudo a ver com os sentidos humanos ), seja a liturgia do dia de hoje tão marcada pela relevância que a estes mesmos sentidos vem dar o evangelista São João. Em primeiro lugar, há o tão espantoso ouvir e depois ver que ele nos conta na sua Carta e pode ter sido a razão/origem da existência dos seus testemunhos..e OUVI atrás de mim uma voz potente, uma voz semelhante à da trombeta, que dizia : o que estás a VER, escreve-o num livro e manda-o às sete igrejas . Voltei-me então para OLHAR em direcção à VOZ que me falava. ... ... VI... ... e DISSE-ME: não tenhas receio,... ... escreve pois o que VIRES: os factos presentes e os que hão-de acontecer depois deles. Tudo isto claramente amalgamado no caldo de cultura da época em que era normal a VISÃO de grandiosidades e luxos decorativos próprios dessas regiões orientais e que encontramos no Livro do Apocalipse e, em última análise ,têm também tudo a ver com os sentidos. Mas é no Evangelho deste Domingo in Albis que, pela incredulidade de Tomé, vemos quanto nós, pobres, simples seres humanos, temos necessidade dos SENTIDOS, para nos situarmos até na nossa Fé. ... chega aqui o teu dedo e VÊ as minhas mãos, aproxima a tua mão e Mete-a no meu Lado... E só então Tomé acreditou.

Foram precisas a simplicidade de criança, a confiança de fieis seguidores, a aprendizagem da convivência com o Espírito, a não entendida experiência dos êxtases, para que ,como disse então Jesus ressuscitado, fossemos dos que são felizes por acreditarem mesmo sem terem VISTO.

Não posso deixar de pensar em Saint-Exupéry quando diz que o essencial é aquilo que se não. Em toda a liturgia de hoje adivinhei o segredo de ter a vida em nome de Deus,por via exclusivamente da minha Fé, se bem que insuspeitadas SINESTESIAS tivessem preparado o meu caminho.



08 abril 2010

Pesadelo e realidade

Alguém sabe o que é viver-se numa grande cidade que até é apelidada de caótica pelos jornalistas da pequena crónica urbana e por aqueles que nela suam "suor e lágrimas" em horas de ponta, e nessa mesma cidade descobrir-se único e só habitante do seu prédio, rodeado de prédios vazios na totalidade, no coração de uma avenida deserta, com um ou outro carro a passar a espaços largos e sem cão, nem gato e principalmente sem pessoas a pisarem passeios ou asfalto ? Alguém viveu alguma vez uma experiência semelhante ? VIVEU, insisto. Não se trata de nenhum pesadelo, daqueles em que sentimos os pés colados a um chão sinistro, numa rua negra... Não : isto de que falo vivi-o eu em pleno Domingo de Páscoa nesta cidade de Lisboa onde pode acontecer esta coisa espantosa de toda a gente do mesmo prédio sair, sair mesmo da cidade, sendo esta migração geral num bairro, num quarteirão, numa freguesia... Assomar a uma janela, de tarde como de noite ,e ver tudo fechado, olhar as bordas dos passeios para os quais, quando dá jeito, até sobem os carros, e não ver lá nem um só estacionado, e ver de vez em quando passar um autocarro dos transportes públicos, a uma velocidade vertiginosa porque não há "clientes" nas paragens, isto adquire foros de pesadelo mesmo.
Não quero, não devo, especular sobre as várias realidades que subjazem neste acontecimento.Afora os medos reais que isto suscita, atropelam-se as conjecturas sociológicas e até políticas.Que se diz, que se explica e como, àquele ÚNICO que ficou, naturalmente só porque não PODIA ir ? Repare-se que este não poder engloba TODAS as circunstâncias impeditivas...
A pensar, quando se fala em solidariedade.

04 abril 2010

Domingo de Páscoa

...a terra era informe e vazia, as trevas cobriam o abismo e o ESPÍRITO DE DEUS movia-se sobre a superfície das águas...
Foi a partir daqui que tudo começou para nós, porque sucessivamente Deus foi vendo que tudo era bom.
Até que o Homem entrando na deriva desta sucessão, foi ocupando os seus lugares, ora tentando guiar-se a si próprio, ora deixando-se guiar, nem sempre talvez como Deus havia visto que era bom...
E chegámos à extraordinária, à espantosa, à misteriosa história de Jesus.
Que celebramos há milhares de anos, arranjando conotações com esse Universo criado - ...dois grandes luzeiros, o maior para presidir ao dia e o menor para presidir á noite...e colocou-os no firmamento dos céus. Seguindo o luzeiro menor, e tendo a terra deixado de ser informe e vazia, festejamos a Passagem, a PÁSCOA desse Jesus como nós o entendemos
Vem marcada a lilás
a Primavera !
Talvez a roxo, dos passos, dos lírios,
dos PASSOS,
dos círios,
dos Compassos
de uma interminável Procissão
de uma densa Paixão
que despenha pelos muros as glicínias
lágrimas grossas a escorrer lilás...

Pietá ainda
pelo drama da SEMENTE
que morreu,
toda a terra se alinda
pela glória dessa flor que RENASCEU !...

02 abril 2010

Sexta - feira Santa


Alexandre Herculano

A CRUZ MUTILADA

Amo-te,ó cruz,no vértice firmada
de esplêndidas igrejas;
amo-te quando, à noite,sobre a campa,
junto ao cipreste alvejas;
amo-te sobre o altar, onde, entre incensos,
as preces te rodeiam;
amo-te quando, em préstito festivo,
as multidões te hasteiam;
amo-te erguida no cruzeiro antigo,
no adro do presbitério,
ou quando o morto, impressa no ataúde,
guias ao cemitério;
amo-te, ó cruz, até quando, no vale,
negrejas, triste e só,
núncia do crime a que deveu a terra
do assassinado,o pó.

Porém quando mais te amo
ó cruz do meu Senhor,
é se te encontro à tarde,
antes de o sol se põr,

na clareira da serra,
que o arvoredo assombra
quando à luz que fenece
se estira a tua sombra

e o dia últimos raios
com o luar mistura,
e o seu hino da tarde
o pinheiral murmura...