12 julho 2009

...sacudi o pó dos vossos pés...

Já vai sendo hábito eu vir lançar aqui as ideias que me assaltam durante ou a seguir às leituras de cada missa de Domingo. Às vezes acabam de nascer, outras vezes já as trago comigo há muito tempo,de outros Domingos, pois, como sabemos, há um repetir cíclico destas leituras, de acordo com uma definida sistematização. Ora hoje chegou a altura de, no Evangelho de São Marcos, aparecer um daqueles episódios que me vêm à cabeça muitas e muitas vezes, porque lhe acho graça e como não sei até que ponto aquela acção era um uso simbólico entre o povo ou teria sido criado por Jesus, na hora, para servir de símbolo dali para a frente, apetece-me tomá-lo para meu uso, algumas vezes,sempre com um sorriso, pensando quão espirituoso foi Jesus ao recomendar a sua prática aos Apóstolos que estava a enviar para o meio das gentes :«...e se algum lugar vos não receber, nem aí vos escutarem, ao sairdes de lá, sacudi o pó dos vossos pés, como testemunho contra eles.» Não esqueçamos que os Apóstolos não levavam nem sandálias, nem nada de bens materiais. Talvez, também por isso, até aquela espécie de não devesse maculá-los com o seu peso.Como já tínhamos visto na Profecia de Ezequiel, era perfeitamente expectável que a aceitação às prédicas de profetas e de apóstolos não fosse lá das maiores, mas verdadeiramente importante era que elas fossem feitas e sem choques ou imposições de prença activa...
No linguajar de hoje, dir-se-ia talvez que Jesus gostaria de falar soft e só em casos extremos saíria dessa postura.
E eu não deixo de recordar, água mole em pedra dura...dizemos nós,da sabedoria popular, mas que o povo foi buscar onde ? Ao sacudir de muito pó de muitos pés, de muitos outros apóstolos ?

08 julho 2009

Que progresso?

Li, num dos múltiplos cadernos em que se desdobram os jornais de fim de semana,um curioso artigo cujo título me chamou logo a atenção por um defeito de coerência gramatical o futuro vai ser tão bom, não foi ?.Com alguma graça o seu autor recorda quanto,pela magia do cinema, nós, os mais velhos, talvez ainda na primeira metade do século XX, nos entusiasmávamos a pensar que no século XXI ( o futuro) já poderíamos ter robots a arrumar-nos a casa, engolir pastilhas como refeição, andar na Lua como em nossa casa,etc.,etc. e o que afinal verificamos é que no FUTURO é que já estamos a viver e não temos nada disso que imaginávamos... Temos outras coisas, é certo, mas aquelas ficaram a fazer parte do nosso passado, não foi ?

E uma coisa enorme,quanto a progresso, é de facto a televisão. Janela aberta para o mundo, longe ou perto, dentro das nossas casas.Se a internet nos possibilita a COMUNICAÇÃO com o mundo, a televisão possibilita-nos VÊ-LO

E ver o mundo sentada no meu sofá é uma comodíssima forma de me sentir viva dentro dele.

A verdade é que se nos abrem horizontes, mas também matéria para dúvidas, crenças, alegrias, indignações, divertimentos, descobertas, um sem- fim de propostas com que vamos podendo preencher variadíssimos espaços de carência de companhias ou de interlocutores válidos.

Como veria eu, velha senhora, a festa de apresentação de um rapaz do foot-ball cujo preço de compra foi de tantos milhões que não cabem na minha tabuada ?
Como veria eu,portuguesa antiga, a celebração de espampanantes exéquias de um ídolo do rock-and-roll americano ?
Pois vi tudo isso, até certos limites que o meu bom senso aguenta,e fiquei a pensar se lá atrás, naquele seculo XX dos tais sonhos de progressos, as pessoas alguma vez sonhariam que o FUTURO delas seria esta necessidade de encontrar ídolos para idolatrar sem nenhum avanço de nenhuma grandeza ?

05 julho 2009

Do Profeta EZEQUIEL

Hoje Ezequiel fala-me de uma coisa que vem ao encontro do que tem sucedido algumas vezes comigo ,ao falar de mim para mim, em situações semelhantes. Ele estava prevenido : vais lá, falas, e eles,como são rebeldes, não vão prestar nenhuma atenção ao que lhes disseres, mas tu vais sempre falando...PELO MENOS SABERÃO QUE HÁ UM PROFETA NO MEIO DELES...
Eu sei que,pelo menos,posso ser A presença.Existo. Lá, como Ezequiel. E insisto.

04 julho 2009

Sophia de Melo Breyner Andresen

Feliz,feliz, é uma pessoa que tem amigos. Amigos que pensam nela, sem ela se fazer lembrada. Amigos que pensam em proporcionar-lhe alegria sem ela se queixar de tristeza.Amigos que se alegram porque a alegraram.Amigos que param para pensar o que é que lhe daria prazer? Assim só, gratuitamente, sem pensar em trocas nem compensações, mas em simples partilha do BOM que eles têm com o amigo que o não tem.
Tudo isto para dizer que uns amigos desses me levaram ao Miradouro da Graça porque lhes palpitou que me daria prazer ir ver o busto que inauguraram em homenagem à SOPHIA .E foi mesmo uma imensa alegria ! Nesta fase da minha vida, nunca poderia ir lá se me não levassem...Oh! quanto estou grata...!
Mas falemos das manhãs claras, das tardes transparentes, que, daquele lugar, o seu olhar de estátua vai fingir que vê, mas que foram com ela, infinito fora, e andarão para sempre a pairar para nós ,por causa dela, sobre aquele Tejo lá adiante...Não era longe dali a sua casa, onde Lisboa a deixava envolver-se em Mundo e depois oferecer-no-lo envolto sempre em luz, na luz que dela irradiava... Sophia ! Ainda bem que vim ver-te...Quem dera nos encontremos por aí !...Um dia...

Um dia...não a pensar futuro, mas presente, bem presente, e agora já tão passado,( !)escrevi isto por causa do que me vinha de ti:

Era límpida a luz
derramada, sem mancha,
sobre as vagas inquietas
a espumar e a escorrer sobre a areia.

Era princípio ainda.
Do dia impuro nada se sabia.
Havia apenas, amplo, iniciático,
o lugar para os sonhos de partida...

Se chegava a ouvir-se o canto da sereia,
ou se apenas o som
cavo e enigmático
das grutas onde nasce a maresia,
quem podia saber ?quem poderia?

Misteriosamente
abriam-se horizontes
entre reminiscências de passado...

E o ar repercutia
um murmúrio salgado e insistente
a confirmar que afinal existia
o areal, o vento, o Mundo de SOPHIA...

Do meu livro Sinestesias

03 julho 2009

Linguagem gestual

Em nove de Junho houve eleições para o Parlamento Europeu e recordo como me desconsolou verificar quanto está a murchar o interesse das pessoas por aquilo que tanto me empolgou quando eu, jovem, universitária e optimista,sonhava para um meu futuro. Não sei se era por causa do estudo dos Gregos ou se era por causa das tertúlias de corredor com os colegas das Filosofias, nós amávamos a DEMOCRACIA.
Foi preciso que désse tempo ao tempo de crescer para conhecer como era realmente o objecto desse amor.
E agora,que até temos um Parlamento e tudo, que passámos todos por tantas vicissitudes, uma bela manhã acordamos com vontade de ir lá, à matrix da nossa democracia para assistir de perto, (porque temos direito a fazê -lo), àquela coisa tão digna como é gerar as leis para as quais nós todos contribuimos um poucochinho (para isso elegemos deputados) , e acontece estar lá, na bancada ministerial ,um senhor que, estando as leis já todas feitas, se zanga porque o seu ouvido captou um àparte de que não gostou,e, como um miúdo da rua, exterioriza em gestos indecorosos o que não teve fôlego( ou honorabilidade?) para verbalizar.Oh! Um Oh! geral...
Então como é que fica este nosso sonho dos vinte anos?
Só se o elanguescer desta planta tão delicada quando há eleições?
E até onde é que isso pode levar um país? que até poderá ter ainda mais sonhadores que os da minha geração...e que não usem linguagem gestual de tão baixa categoria...