28 fevereiro 2010

Quaresma 2


No alto de montanhas embrumadas
sonhei erguer também a minha tenda,
mas de nuvem nenhuma ouvi falar-me
aquela voz que eu queria a consolar-me.

De Tiago, de Pedro ou de João
o silêncio também que Jesus queria...
Gritei, interpelei, nos meus desertos
e apenas encontrei pra mim abertos

os submissos caminhos de Abraão,
e a conturbada estrada que subia...

24 fevereiro 2010

As flores que merecemos...


Completar-se-ão em Abril ciquenta e nove anos que vivo como condómina num prédio integrante de um bairro construido na época do Estado Novo com finalidades sociais. E, como tal, penso eu, foi atribuida a cada habitação uma minúscula fatia de terreno, nas trazeiras do prédio, chamando-se-lhe civicamente logradouro. Pouco mais ou menos três palmos por quatro de terreno, não é que permitem que demos asas a algumas fantasias botânicas e até bucólicas ? Logradouro é também para alguns a miniatura de uma lavoura de batatas, alfaces, favas e ainda por cima de árvores de fruto... Em suma uma pequena via de evasão muito bem pensada por quem concebeu o projecto que de certo tinha tanto de psicólogo quanto de arquitecto...
Pois bem. Agora que o Fevereiro se aproxima do fim com um curriculum de invernias desmesuradas e trágicas ( estou a falar do meu Funchal ), quando era costume estarmos já a pressentir a Primavera, olhei cá de cima o meu logradouro hoje de manhã, aproveitando uma pequena "aberta" na ventania e na chuva e_ ninguém me vai acreditar, paciência_ vieram lágrimas aos meus olhos e uma palavra de louvado seja Deus ! aos meus lábios : todos os alvíssimos jarros estão em flor, a cameleira, alvo de todos os meus orgulhos botânicos, coberta de rubras camélias e múltiplos botões, a alfazema transformada num tufo enorme e o abacateiro já criando a sua larga copa, meio verde, meio rosada, com porte já de arvoresinha que está começando a ser !... Quer dizer que a natureza cumpre. Apesar das granizadas, das geadas, das ventanias, do nosso abandono, porque durante estas intempéries nem nos aproximámos delas, as plantinhas cá estão, presentes, todas catitas, coloridas, garbosas, agora algumas a enfeitarem as minhas jarras e darem um ar de festa à minha casa, cumprindo rigorosamente o calendário.
Que lição tirar de tudo isto ? Quando eu tenho andado a pensar, desde o tsunami, passando pelos nevões mortíferos, pelas praias tragadas pelo mar, pelo terramoto do Haiti e por esta avassaladora derrocada da Madeira, tenho andado a pensar,repito, que a Natureza nos está a enviar algum recado, algum aviso, brotam-me "em casa" as flores,`a hora certa, nos dias certos, e mesmo quando eu mais preciso delas... e,talvez, quando menos as mereço ...

20 fevereiro 2010

Quaresma 1

Diz São Paulo hoje que está perto de nós a palavra, nos nossos lábios e nos nossos corações, veículo da Fé que nós "passamos" a quem está comnosco. Assim ficou comigo a palavra que li de Nicolas Malebranche :
Senhor, não te esqueças de mim!
Senhor, não te esqueças dos meus problemas, quando eu trato dos teus.
Não te esqueças mesmo quando eu não atendia nem os meus, nem os teus, mesmo quando eu arruinava os meus interesses e adiava os teus.
Quantas vezes derrubei o que tinhas edificado !
Quantas vezes profanei o que tinhas santificado !
Muitas vezes adiei a conclusão da tua obra !
Eis-me perante Ti consciente dos males que causei.
Ponho-me na tua presença como um instrumento pronto a seguir todos os teus movimentos.Ensina-me a reparar as desordens e dá-me a honra de me empregares nos teus serviços. Anima-me com o teu espírito, ilumina-me, fortalece-me.

É com palavras como estas que eu quero colmatar o que me falta para viver em plenitude a presente quaresma. Assim Deus me ajude !

18 fevereiro 2010


Férias ! Aquela primeira sílaba muito aberta, aquele F muito esguio, fazem daquela palavra uma espécie de explosão, rebentamento e ascenção,e lá vamos nós ,todos empolgados naquela direcção do que ascende, do que nos leva para cima,do que, ainda por cima, estraleja, brilha, sugere festa, alegria...
E como pode ser tudo isso em tradução baça ?
O céu carregou e adquiriu em definitivo aquela cor cinza sem manchas nem rasgões que, noutras latitudes, é prenúncio de nevão. Só que, por onde andei, o nevão não aconteceu. Veio sim um frio perto do zero e do negativo da escala ,naquele local , mas muito abaixo no negativo lá para Trás-os-Montes , Beiras e Alentejo Perdeu-se então a vontade de andar ao tempo e voltámo-nos para dentro dos quentinhos das casas com as suas labaredas de boa lenha de azinho a crepitar nas lareiras. O estralejar festivo da palavra FÉRIAS, passou a residir no estalar das grossas cavacas.
E todos os prazeres , desde a leitura partilhada e discutida, até à escolha da música mais apetecida, com as problemáticas situações a resolver em jogos de sala ingleses, e excelentes petiscos a intervalar, foram sendo adicionados ao mágico deixar correr o tempo a ver chover, através das portadas de vidro.

Perguntar-se-á se a esta espécie de pacífico torpor se poderá associar a ideia de que estas são, foram, as férias dos bailes até de manhã, dos corsos e batalhas de flores, dos concursos de trajes de mascarados, das partidas com bolos feitos de algodão,
inocentíssimos gozos e marotices de que depois ainda nos penitenciávamos na Quaresma a chegar. Poderá ser que estejamos a falar apenas de recordações que aqui e ali neste nosso país ainda muito esporadicamente se fazem lembrar?

Pois pode ser, pode! Prova disso mesmo estas pequenas férias de quatro dias apanhando esse tãoestafado Carnaval que nos tempos que passam já pouca gente atura. Os portugueses estamos menos amigos de brincar daquela maneira meio infantil que antigamente recebia o nome de entrudo e que era atrevida, galhofeira, um tanto grosseira às vezes, um tanto lasciva mas com alegria sã. Os carnavais eróticos e teatrais importáveis de outros países vieram alterar aquilo que antes poderia ter sido uma forma de purga de alguns desgostos sofridos em silêncio.

Por isso então o Carnaval passou a ser uma época para pequenas viagens, para a NEVE quase sempre... E, em matéria de neve , este Carnaval foi excelente na nossa terra! Em frio, como já
disse, excederam-se as previsões. Por detrás das grandes portadas de vidro recordáva-se a luminosa paisagem de verão e isso era já parte dos doces calorsinhos que nos envolveram estes dias... Como dizia Santa Teresa só isso basta ( bastou, digo eu...)

11 fevereiro 2010


Um dia pleno ! Isto é tão raro que até apetece registar : haver um dia em que só acontecem coisas boas, positivas,que dão alegria . A notícia da saída do meu LIVRO, tão esperada, logo à hora do pequeno almoço. Um alvoroço daqueles que se não podem suportar a´sós e vá de telefonar, comunicar, ouvir... E, dia da minha Nossa Senhora padroeira, Nossa Senhora de Lourdes ! Logo hoje ! Tive a estranha sensação de SER ! ÚNICA. ISOLADA. EU. Pronto, é vaidade.Começa-se logo a ficar IMENSA! E, subitamente,felizmente, rasga-se esta nuvem, porque alguém vem falar-nos de qualquer coisa real e comesinha, como por exemplo está na sala a administradora do condomínio...E lá retomo eu o meu tamanho real. Recebo a senhora ainda um pouco alvoroçada mas só eu o sei. Os assuntos a tratar eram simpáticos e a Senhora é-o também.A seguir, a Paróquia, na pessoa da senhora Voluntária que me assiste :" vou buscá-la espere-me às duas.Está um dia lindo.! " E esteve. Na minha Igreja, tanta gente a mimar-me e depois os cãnticos, lindos, suaves, propícios ao recolhimento, á tomada de consciência de quanto vale mesmo este tesouro que é VIVER, apesar de termos ainda no peito aquele amargo de termos perdido mais aquela amiga que partiu no domingo... Ontem, por causa disso, uma aluna trazia-me uns bolinhos feitos por ela , com o seu carinho jovem, generoso, que torna só por si a Vida bela É mesmo misterioso tudo isto que se passa em redor de estarmos vivos e gostarmos, sempre e apesar de tanta coisa que dói... A nossa Fé com os seus ritos adoça tanto as desesperanças que julgamos não poder vencer !
Foi realmente um dia feliz ,este de hoje.

07 fevereiro 2010

....ao Largo !

FAZ-TE AO LARGO ! - em São Lucas, hoje.
Devemos ler : Ultrapassa os teus limites , na nossa vida, especialmente AGORA !

05 fevereiro 2010

Ensinar Português hoje

É um fim de dia, acabadas as aulas, e posso dizer que preciso de um descanso, como um guerreiro depois da batalha. Porque é uma verdadeira luta prender o interesse e o gosto pela literatura em geral e particularmente pela poesia a rapazes de dezasseis e dezoito anos, praticantes de todos os desportos, alguns até federados, e entusiastas de toda a espécie de youtubes e ipods e ipads que há. Toda a capacidade criativa de qualquer professor de Português de hoje, tenho a certeza que esbarra com as modernas barreiras de transmissão de conhecimentos, a começar até pela própria Língua, visto que é o inglês que predomina e acontece por vezes que, para" entrarem" melhor no sentido de algumas palavras ou frases eles me perguntam mas quer dizer isto?, sendo o isto dito em inglês !
Mas a verdade é que, quanto mais avançam no cumprimento dos Programas dos respectivos anos, mais as coisas se complicam porque os autores a estudar se lhes vão revelando cada vez mais hereméticos, quase inacessíveis. O primeiro embate vem com o Fernando Pessoa e a questão dos heterónimos. Não acredito que o imenso número de estudantes dos últimos três ou cinco anos que "passou" nos exames em que os textos fossem de Pessoa seja hoje e agora conhecedor de alguma coisa que reste do que meteu na cabeça à força, para o exame apenas, não para SABER. Claro que estou a não contar com as excepçõrs que, quando aparecem são as delícias da alma de qualquer professor. Posso gabar-me de já ter tido essa experiência algumas vezes. Amarem o autor, perceberem a elegância, a ironia, a metáfora, o non-sense, a desconstrução, e o sabor das palavras...Quando isso acontece, é certo que gostam, perguntam, querem saber mais...
Todo este meu desabafo é apenas e só porque creio que o estudo do Português tem que ser conduzido noutro sentido,ou noutros sentidos, porque há demasiada variedade de interesses nos alunos de hoje e não se lhes pode exigir que amem o que nada,fora da aula, os prepara para entenderem. E acresce que os novíssimos autores se deliciam cada vez mais numa forma heremética e cabalística de se exprimirem e que a Língua portuguesa está a ser cada vez mais sacudida por enormes abanões que a diminuem em todo o terreno.
A Língua Portuguesa será ainda a nossa Pátria?

03 fevereiro 2010

...estará "o inverno fora" ?

...E não é que se confirma? Desde que sou gente que oiço " se chora, está o inverno fora, se rir está para vir" Isto quanto ao cariz meteorológico do dia. Pois ontem esteve um dia lindo ! Só um pouquinho de frio, mas até já apetecia abrir as janelas e deixar entrar a Primavera. Era o dia da Senhora das Candeias.
Hoje, que é do sol ? Chove miudinho e o céu é outra vez uma pasta de chumbo...
Grande é a sabedoria do povo !