27 janeiro 2009

O Caminho de São Paulo


Vem durando o ano em que a Igreja comemora a Conversão de São Paulo, dando-lhe a designação de Ano Paulino, de que eu nunca gostei. Quanto a mim, haveria outras designações menos frias, mais calorosas para nos fazer entrar "a fundo" no Extra-Ordinário que teve ( e que terá ) o fenómeno da conversão de um ser humano com uma estrutura mental completamente arreigada em princípios não só diferentes, mas opostos, contrários. CONVERSÃO, presupõe uma nova versão do que quer que seja e uma nova versão filosófica,intelectual e até dogmática de uma pessoa não é realmente de se encarar sem um enorme espanto e, posteriormente, um enorme respeito, uma enorme admiração. Daí à Estrada de Damasco só mesmo de mão dada com a nossa Fé... E então este Apóstolo do cara -a- cara, avesso às ruidosas exposições mas incisivo nos actos e até na doçura das palavras, surge-nos tão especial que, da sua acção à sua maneira de falar de Deus, o sentimos calorosamente a nosso lado, em muitas situações nossas, miseravelmente quase paganizadas...
...e a levarem-nos quase à revolta na Fé...
Perguntei hoje a Deus « onde está oTeu amor por nós ? a tua Misericórdia ?»
Aquela AMIGA, Senhor, porque o consentes ?
A nossa dor, Senhor, como a merecemos ? Onde o erro dela? E o nosso ?
E a resposta existiu para minha conformação, para minha meditação.
É o nosso percurso de vida . Será a nossa Estrada de Damasco ...

24 janeiro 2009

Recordar apenas

Éramos todos jovens, bonitos ( ! ! ! ) e sonhadores. Havia os "mais velhos", cheios de conhecimentos e de algumas experiências, que os "mais novos" admiravam, ouviam e...invejavam ! Quando estes chegaram às universidades os outros já por lá tinham passado a fazer o que eu hoje chamaria o básico mas ainda andavam por lá ou apareciam quando podiam...
E acrescia que, a alguns, nós conhecíamos cá "de fora" porque até as famílias eram amigas...Parece até que o país era mais pequeno, mais provinciano; quase todos se conheciam e mantinham-se relações de sociedade que hoje não vejo cultivarem-se, pelo menos da mesma maneira. Sempre vi em casa de meus Pais haver uns dias certos em que vinham amigos e se jogava o bridge e o mah-jong...
Pois essas "pessoas grandes" tinham filhos dos quais muitos iam cruzar os meus caminhos de estudante e assim se ia tecendo a teia das relações que, de uma maneira ou de outra, passavam a ser as nossas, as dos jovens do meu tempo.
Assim conheci a Stela. Os Pais amigos lá de casa.Aquela filha, muito bonita,mas muito especial... Naquelas idades a nossa diferença parecia muito maior... Dizia-se, dizia-se... e eu já a admirava .
Ela casa pela segunda vez no ano seguinte ao do meu casamento e tinha um filho afilhado de Álvaro Cunhal. Era filho de António Fiadeiro, seu primeiro marido. E uma filha afilhada de Piteira Santos, com quem casou em segundas núpcias e com quem partilhou toda a vida aventurosa dos políticos profundos com os quais sempre se entrosou... Era o" diz-se, diz-se "da sociedade em que nascera e fora criada. Chegámos a falar-nos em ocasiões muito especiais e eu tive oportunidade de dizer-lhe como já a havia invejado e como depois a estimei, a admirei.
No jornal de há dois dias leio a notícia da sua morte . Tinha agora 91 anos . Ambas velhas, só que eu alguma coisa menos.
E indubitavelmente muito menos Vida vivida, muito menos empenho, muito menos coragem...
Stela Correia Ribeiro... Algumas vezes, lá naqueles incríveis claustros da Faculdade, lembras-te ?

18 janeiro 2009

Agualusa e a Língua Portuguesa

Quando Maomé não vai à montanha, lá vai a montanha a Maomé. E muitas vezes,nos dias de agora, é a televisão que coloca a montanha dentro da casa de Maomé...

Assisti, por simples acaso, a uma entrevista dada por José Eduardo Agualusa, autor que aprecio por tantas razões que até o recomendo a alunos não só para prazer de ler, como para fazerem certos trabalhos cujo ponto de partida os professores das Escolas deixam à sua livre escolha.

A entrevista a que assisti cheia de interesse, como se depreenderá, estava encastrada num programa que a RTP preparara para celebrar, louvar, estimular e dar estatuto de espontaneidade, propensão natural da nossa gente para uma multiculturalidade que prove que somos um povo acolhedor e não racista para o que nos terá preparado e dotado a antiquíssima convivência com todos os povos do mundo que então andámos descobrindo. Era uma sala de teatro repleta de convidados de todas as proveniências e raças e que hoje habitam entre nós. E foram-se contando e mostrando exemplos, uns mais bem sucedidos que outros, como é natural, mas todos mostrando o quanto havia de positivo neste convívio português.
E assim surge AGUALUSA um escritor angolano, formado em universidades portuguesas, com vários prémios literários atribuidos em Portugal( lembro-me que um deles foi mesmo o de REVELAÇÃO) e usuário de um português fluente e correcto, uma das valias daquilo que escreve.
Tendo vindo à tona da conversa a dificuldade que é para a aculturação a língua, o português e o impacte que pode vir a ter o Acordo Luso-Brasileiro, AGUALUSA afirma que nada poderá afectar o português que "serve" a multiculturalidade porque verdadeiramente NUNCA foi uma língua estreme, dado que na sua constituição desde muito cedo teve séculos de influências até de línguas africanas ( falando quase "en passant" da presença árabe que é africana, em bom rigor ) e passando logo a falar do brasileiro que é hoje praticamente o único português conhecido no mundo, ilustrando a sua afirmação com uma históriasinha passada consigo e um menino brasileiro... Bem, eu penso que uma conversa assim,não pode ser feita por ignorância da parte de uma pessoa com a responsabilidade de um premiado literário, tão pouco a entrevistadora estava ali para estabelecer contraditórios com os entrevistados, mas a presença de tantos estrangeiros cheios de boa vontade, simpatia e alguns até gratidão para com tudo o que é português, transformou aquelas afirmações num deslize muito desagradável, se não quisermos pensar que foi uma maldadesinha. Se uma língua aparece já em pleno século IX EM DOCUMENTOS NOTARIAIS e em 1198 aparece a famosa Cantiga da Garvaia, como é que só vale a pena falar das influências norte-africanas quando a maior parte do nosso vocabulário já estava constituido ?

17 janeiro 2009

Miguel Torga

Hoje quero lembrar Miguel Torga. Quereria que ninguém se esquecesse de lembrar Miguel Torga.

Ter um destino é não caber no berço
onde o corpo nasceu.
É transpor as fronteiras uma a uma
e morrer sem nenhuma

Por sintonia de gostos e por simpatia de amigos, foi-me enviada uma completíssima informação sobre TORGA, numa apresentação de PowerPoint a merecer a pesquisa em Google por "Miguel-torga.pps" ou, p. ex., utilizando este link.

15 janeiro 2009

Esperança de Vida

Já nem sei se é a minha disposição demasiado amarga para o que é meu hábito, ou se é a disposição alheia e envolvente, o certo é que ainda não vi à minha volta, nesta primeira quinzena do novo ano, manifestação alguma do prazer de estar vivo, de ter promessas felizes à espera, de alegria, em suma... E vieram os meus jovens alunos, e falaram comigo,se não todos, quase todos os meus amigos e conhecidos, e encontrei antigos conhecimentos com variados percursos já feitos ou ainda a fazê-los, e de nenhum olhar, de nenhuns lábios, eu vi ou ouvi saltar aquela faísca que noutro tempo pegava fogo ao meu próprio entusiasmo...Foi minha a falta ?
Pessoas como eu, são agora chamadas a pensar que já estão vivendo tempo demais... As medidas governamentais vêm lembrar-nos de que não se esperava isto de nós, quando nos permitiram que nos reformássemos... Dizem que nessa altura a chamada esperança de vida era uma e agora é... ...demais ! Que fazer ? Mesmo que não se queira, isto é, no mínimo´desmotivador ! Só há mesmo que olhar à volta e procurar sementes de vida onde encontremos esteios para o que, apesar de tudo, ainda resta em nós de esperança...Diz o velho ditado que a esperança´é a última a morrer. Pois que seja ! Mas como eu preciso da alegria dos outros, meu Deus que me criáste para amar a Vida !...

01 janeiro 2009

Ano Novo; que pobreza?

Lindíssimas, todas nos tons deslizantes entre o amarelo torrado e o vermelho-sangue, as flores em braçadas maciças, como sempre, oferecidas por San Remo, lá estavam a emoldurar tudo o que é emoldurável, a sala repleta de um público tão homogénio na sua forma de vestir como na sua forma de reagir à música que lhe é oferecida, como na sua maneira de aplaudir, que chega a dar-nos a impressão de que ficaram lá sentados todos, desde o ano passado e do anterior e do outro ainda anterior e por aí fora...É do Concerto de Ano Novo em Viena que eu estou a falar, ainda sob a impressão fortíssima que ele me deixou uma vez mais, pois acaba de ser transmitido há apenas minutos.A família Strauss com as suas polcas, galopes, marchas e VALSAS, este ano ainda "permitiu" um ou outro compositor, como Hayden,de que me lembro, mas o que fez deste concerto algo de especial foi o maestro. BARENBOIM é um extraordinário intérprete daquilo que certamente os compositores queriam transmitir nas suas obras. Pelo menos é essa a impressão com que se fica quando ele passa de uma alegria esfusiante para um sentimentalismo sussurrante, ou de um ritmo requebrado para uma correria desenfreada, tudo com um tirar da orquestra efeitos absolutamente originais. Provavelmente a minha admiração por Barenboim também estará um pouco marcada pelo que sei que ele tenta fazer em favor de uma paz que a cada dia que passa parece mais impossível.Se israelitas e palestinianos conseguem conviver harmoniosamente numa orquestra que não é a Filarmónica de Viena, mas que ele criou para ser pelo menos tão boa quanto esta, como é que um homem destes não há-de fazer tudo o que pode para conseguir que aqueles dois povos se respeitem e enterrem de uma vez os seus machados de guerra ?
Creio que não haverá ninguém no mundo da boa vontade que não esteja impressionado com o que tem sido o Natal na Palestina, por mais próximo no tempo, mas de um modo geral no mundo da dor que ,ao fim e ao cabo, resulta da cada vez mais densa e opaca pobreza . Hoje, na homilia da missa no Vaticano, sendo este o Dia Mundial da Paz, o Papa fez uma espécie de sistematização das pobrezas que nunca me tinha ocorrido e, com a cabeça cheia da música de Barenboim, acabei relacionando e lamentando certas exibições patenteadas nas múltiplas formas de passagens de ano que a comunicação social lançou em reportagens ou notícias por esse mundo fora. A qual das diferentes pobrezas terá quem possa (ou saiba )que acudir primeiro ?
E eu ?... Vejo -me a abeirar do ano de 2009 cheia de dúvidas e a tentar furiosamente salvaguardar algumas certezas que não deixo que me tirem.