24 agosto 2006

CARDAL


Lembro-me de que abria a janela de par em par e me entrava pelo quarto dentro o perfume das folhas das figueiras. Era um perfume acre e denso, trazido pela humidade do riacho de águas saltitantes e geladas àquela hora e à beira do qual se alinhavam duas ou três enormes figueiras.
Isto, era ainda lusco-fusco, acinzentado, da manhã que lá vinha.
Mais tarde, eu descia e "ia aos figos"...Já eram outros os cheiros e tudo, na manhã que aquecia, me convidava ou desafiava...
Tudo isto me vem invariavelmente à memória agora, quando, pela manhãsinha, abro as portadas para o terraço e, mais do que pela majestade do lago, lá em baixo, ainda pouco verde, meio lilás e embrumado, me sinto enfeitiçada por aquele perfume vegetal, mal definido, com cambiantes que vão das plantas de jardim aos arvoredos e às ervas bravas...Náo deixo de sorrir ao pensar na luta "ingente" em que se empenham agora os meus amigos contra uma nada pacífica invasão de toupeiras.Isto não é de amigo, mas eu entendo tão bem a volúpia dos animaisinhos a saborearem a frescura e os perfumes destas terras tão mimadas pelos donos.tão macias, tão convidativas !...Das gotículas frescas que o sol vai fazendo brilhar sobre cada planta, parece evolar-se uma humidade límpida e cheirosa e longe, lá muito longe dali, há gente que queima a lenha do primeiro forno, do primeiro pão do dia...
Já não tenho há muito aquela idade de"ir aos figos", mas fico-me a "saborear" todos estes desafios do dia que começa e eu tenho a Graça de poder viver...

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