27 setembro 2009

...naqueles dias o Senhor desceu numa nuvem...

Creio ter já mostrado de muitas maneiras e feitios omeu encanto pelo Antigo Testamento pela quantidade e qualidade da informação que dele retiro para situar-me no tempo e no modo em que, da pureza dos princípios de tudo, à cáustica caracterização dos caracteres humanos, se fez possível e até necessário o aparecimento dos Profetas cuja voz consegue ecoar através e por cima de tantos séculos chegando até nós com a clarividência e actualidade que sempre me deixam fascinada.Mas é da voz grandíloqua de Moisés que ouvimos na primeira leitura da missa de hoje a transmissão da vontade do Senhor, nosso Deus, de que não há que afastar ou pré-condenar aqueles que, não sendo ou nem mesmo sabendo como se é um cristão confesso, pelas suas acções e pelas suas palavras, se colocam, na prática de vida, ao lado dos mais convictos seguidores da Lei de Deus. O mesmo nos repete São Marcos no Evangelho, completando aliás este seu"recado" com aquelas sugestões de amputações, castigo verdadeiro dos que, na prática de vida, ofendam pessoas nas referidas condições. Há uma particular dureza, também revelada na Carta de São Tiago, nestas noções de castigos ou ausência de complacências que me parecem um tanto por fora da misericórdia divina, e por isso é que eu gosto de conhecer os tempos e os modos, como já disse, porque dessa forma fico-me apenas pela enorme gravidade atribuida então aos desvios emergentes, coisa que,na nossa actualidade está a ser cada dia mais subvertida.

Não queria mesmo pensar nestas subversões que todos os dias estamos a ser convidados a aceitar como boas, porque hoje foi politicamente aquele dia de ter fé cívica e acreditar no melhor de cada homem : tiveram lugar as ELEIÇÕES para um novo Governo e eu votei a acreditar que votava para tudo o que pudesse ser melhor para este povo e este país,agora tão sofridos...

20 setembro 2009

No nosso dia-a-dia, a Fé

Porque estamos a dois dias do começo do Outono, a estação do ano minha preferida, acordei, como sempre ,ao lusco-fusco e também como sempre, pousei os olhos no meu velho, velhíssimo, crucifixo que àquela hora só os meus olhos vêem, porque sabem que está ali e pensei claríssimo, como se tivesse estado toda a noite a meditar : é mesmo necessária a morte que o outono nos traz, para que possa haver o renascer na primavera...a verdadeira Ressurreição !
Parti para a minha manhã a pensar na densidade desta evidência, de repente para mim tão "evidente" e foi neste espírito que ouvi e li o que a liturgia de hoje nos trazia. Além de Jesus a ensinar aqueles homens seus discípulos que ,de tão simples, às vezes procedem como crianças, surge-nos uma leitura um tanto cruel do Livro da Sabedoria e depois uma Carta de São Tiago que, caída nesta época de efervescência política em que estamos, a uma semana de eleições, me deixou completamente fascinada por várias razões, mas principalmente pelo seu carácter premonitório : A justiça é um fruto produzido na paz, para aqueles que praticam a paz. De onde vêm as guerras? De onde procedem os conflitos entre vós? Não é precisamente das vossas paixões? Cobiçais e nada conseguis : então assassinais. Sois invejosos e não conseguis obter nada: então entrais em conflitos ou guerras. Não tendes nada porque ... pedis mal, visto que o que pedis é apenas para satisfazer as vossas paixões. Ora isto vem a ter um eco reconhecível na lição de Jesus aos apóstolos quando lhes diz Quem quiser ser o primeiro será o último e será o que for "servo de todos".Que mais revelações me trará este domingo sobre como a minha fé pode abrir-me os olhos para a minha vida comigo e para a minha vida socio-política?

18 setembro 2009

por causa de GUNTER GRASS

Quando, há alguns anos, tomei conhecimento da existência do Centro Cultural de São Lourenço, em Almansil e o visitei demorada e encantadamente, tomei também conhecimento com um artista alemão de quem nunca tinha ouvido falar e que, residindo então naquele Algarve interior que acolhia a cada prega de terreno cidadãos de todo o mundo que por ali se sentiam em verdadeiros retornos às origens, viera expor naquele sítio acolhedor umas lindíssimas aguarelas, desenhos e esboços preparatórios de uma obra que viria a publicar mais tarde. Era Gunter Grass, um homem indubitavelmente controverso, não só pelas suas opções políticas e sociais, como até pelos seus percursos artísticos, da pintura e escultura para a literatura, sempre nas bermas de um certo humor, a escorregar depois para uma maior convicção surrealista, mas de tal forma inteligente que acabou por vir a merecer um Nobel da literatura, em 1999. Porque me lembro de tudo isto agora? Porque, tendo sido sempre uma leitora-admiradora de Augusto Abelaira, li, nos anos 60, uma tradução de O Tambor de Grass feita por Abelaira, de que gostei tanto que fiquei com aquele autor no meu registo de preferências e acabo de saber que, por se completarem agora cinquenta anos sobre a sua publicação primeira, se achou interessante lançar uma nova tradução. A este livro se seguiram outros dos quais um tem o título bizarro e sugestivo de Descascando a Cebola. Acho-o sugestivo porque, podendo dizer-se que tudo o que escreveu Grass é autobiográfico, é verdadeiramente o descascar de uma cebola o acto de ir contando as sucessivas camadas que vão constituindo as nossas vidas... Hoje e aqui, acabo de descascar uma nova camada da minha vida, não foi?

13 setembro 2009

São Marcos, 8

E vós quem dizeis que eu sou ? Todos sabemos quanto eram transparentes para Jesus aqueles homens que o seguiam. Tinha-os escolhido. No entanto tinha ainda tanto que lhes ensinar ! E era tão extraordinário o que pacientemente lhes explicou que não podia esperar deles que aceitassem com naturalidade o que entrava no âmbito do sobrenatural. Foi preciso dizer-lhes de uma maneira chocante que nada do que podiam ser interresses humanos poderia cimentar o tipo de relação a existir entre eles, o que deixou Pedro muito vexado, não só pela reprimenda de Jesus, como por não ter sido, capaz de compreender sozinho que era toda uma Vida Nova , com valores diferentes, aquela que era no mínimo exigível a quem se dispusesse a seguir o que aquele Homem Novo e diferente vinha ensinando. Vinha exigindo. Não é doce ouvir-se dizer que se perde a vida porque não se percebeu como é que ela devia ser vivida...
Não é mesmo nada fácil. E então realizar que,pelo contrário, ela pode ser ganha
se levada pelo caminho daquele humilde aniquilamento das vaidades, das exibições, das emulações,das pesporrências...Jesus sabia bem que tinha em seu redor ainda muito de tudo isto que tolda até o olhar que olha para os outros e os mede nas suas próprias medidas. Por isso teve que ser exemplarmente duro com Pedro que, na altura, ainda não aprendera o dom salvífico da humildade...
Se eu fizer a algum daqueles com quem vivo dia a dia a mesma pergunta que Jesus fez então, quantas vivências diferentes vou descobrir através da respostas que me derem ? E como irá o meu ego reagir a elas ?s

10 setembro 2009

...à defesa


Seriam umas cinco da manhã e os deuses zangaram-se todos de tal maneira que rolavam mobílias nas suas moradas de nuvens,atiravam-se uns de encontro aos outros a rosnar longamente, sucessivamente, progressivamente. E vieram-se chegando, cada vez para mais perto de nós, num crescendo de estilhaços de luz e de urros abafados, a reboar, a reboar, por cima, por baixo, por todos os lados daquela camada negra de nuvens que os sustentava... A briga arrastou-se até um climax estrepitoso, cerca das oito horas, em que todos podiamos pensar que os deuses estavam despejando sobre os pobres de nós , todos os seus carros de lenha, ou tábuas grossas...Só então houve uns que choraram raivosos, umas lágrimas que pareciam chicotes, fustigantes e rápidas. E nós já todos a pensar que as lágrimas acabariam com tamanho desacato... Mas não. Diminuiram os decibéis e o tumulto foi rolando aos poucos para mais longe, como um eco, a escoar-se, a escoar-se até para lá das nove horas !
Isto foi uma daquelas trovoadas que só acontecem a espaços de anos, em Lisboa. Dentro de uma moldura de dias de calor sem pausas, sem alívios nem de noite...Mau mesmo !
Bichos da Terra, percebemos que temos toda esta carga eléctrica a agitar-nos.porque dormimos mal , porque estamos irritadiços, porque sentimos de repente que se nos solta a língua para dizermos coisas que antes não ousávamos, talvez mesmo pensar, quanto mais dizer alto e bom som, porque,ao mesmo tempo, estamos com medos vários... Anda no ar esta revoada da política dos políticos a desinquietar-nos e também rolam as tempestades dos humanos.
Viver todos os dias também cansa é o título de um livro que li há anos. De Pedro Paixão que não conheço. Se ele soubesse quanto tenho pensado nele, pela sua escolha de tal título ! É que é mesmo o que este tempo, esta época, este clima, nos estão fazendo pensar. Cansa, sim , gostarmos de sorrir, de ser amáveis, de ter esperança, de gostar... E tudo ter que ser tão `a defesa...
A foto não é de minha autoria. Apenas me foi oferecida sem identificação de autor.