29 julho 2007

Reflexões sobre as leituras da liturgia de hoje

Os três textos encerram lições que sempre têm “mexido” comigo de uma maneira muito peculiar, cada um por uma razão distinta. O problema da justiça nas repreensões ou mesmo punições a dar àqueles que prevaricam, podendo essa punição vir a projectar-se no todo de que o prevaricador é parte, é de facto um grande embaraço para quem se vê na contingência de ter que castigar. Na verdade, assalta-me a grande dúvida sobre apenas um conceito: a Justiça. A preocupação de Abraão quando se atreve a insistir, e insistir, e insistir, junto de Deus, sobre as hipóteses possíveis nas cidades do pecado, não é outra senão a preocupação sobre a justiça, mesmo sendo Deus a entender aplicá-la. E afinal o que aprendemos nós com a atitude de Deus? Que o que prevalece são os critérios de misericórdia e de perdão, visionando nós, como pano de fundo, os méritos da solidariedade. A possibilidade da nova oportunidade não é sequer aflorada neste episódio do Génesis mas Jesus permite-a mais tarde . “ Vai e não voltes a pecar”, além de ser uma enorme caridade é uma extraordinária prova de confiança que eu creio que ninguém teria jamais coragem de trair...E é dentro desse espírito de perdão e confiança que São Paulo vem depois dizer que nós somos todos já” ressuscitados”, considerando metaforicamente que os nossos pecados, pelos quais Jesus se deixou morrer, eram a nossa morte, antes de tão espantosa purificação. Aprendemos pois a contar com todas as benevolências divinas de tal modo que perdemos todo o pudor face ao nosso Deus e quase deixámos de saber falar-lhe porque em permanência e quase exclusivamente temos coisas a “PEDIR”.São Lucas reporta que JESUS terá estimulado os discípulos a pedir “Pedi e dar-se-vos-á” mas antes ensinou-lhes como e O que pedir, Aqui nasce a nossa oração de acesso ao Pai que nós já banalizámos tanto que quase já nos sai mais dos lábios do que do coração. Pensar, de vez em quando, em cada uma das frases do PAI-NOSSO é pois necessário ...e urgente. Porque seremos ouvidos; mas irá junta alguma parcela também do nosso Amor...

25 julho 2007

Fátima 3

Não foi nenhuma peregrinação de data, comemoração ou comunidade instituidas. Fui ontem a Fátima, primeiro porque sentia saudades de respirar o que lá se respira, depois porque me pareceu particularmente apropriado levar lá, convidadas por mim, umas pessoas especiais. Individualizando :uma amiga que me cumula de "miminhos" quase diários, formatados em bolos, bolinhos e doces e cuja viuvez recente ainda não lhe ensinou tanto quanto a minha; uma jovem mãe com a sua filha de onze anos, residentes no Rio de Janeiro há muitos anos, mas de nacionalidade portuguesa, e agora de visita à família e seus amigos, em clima de matar saudades , a mais velha, e de afivelar laços a este país tão seu quanto desconhecido, a mais nova.Para melhor dizer, esta nasceu mesmo no Rio e, tendo mantido a nacionalidade portuguesa, só agora começa a aperceber-se do que é ter uma pátria do outro lado do mar e tem curiosidades inerentes a essa realidade.Sou( o que se pode dizer com propriedade) uma velha amiga desta família, amizade que nasceu nas aulas que dei à sua terceira geração, contando desta brasileirinha para trás. Por isso, sei o quanto e o como da irreliogiosidade dos que viveram sempre aqui e maravilho-me perante a Graça de Deus que fez cristãs, crentes e praticantes, as que espiritualmente se fizeram pessoas no Brasil. E porque esta diferença existe, nunca haveria alguém da família que pensasse em avivar ou revelar locais, usos e tradições religiosos tão nossos, a estas duas portuguesinhas em visita que, por ser curta, já tinha uma programação repleta de lindas coisas,preparadas com muito amor mas onde ninguém se lembra de que a Fé é também cordão umbilical. E lá fomos nós a Fátima. O dia esteve glorioso, sem frio nem calor,sem vento e duma limpidez transparente como eu só conheço naquelas serras. Por isso mesmo, pudemos ir visitar o Calvário dos Hungaros que é o meu local preferido, fora do Santuário. Será escusado pormenorizar todo aquele dia de isto é porque... ali diz-se que...imagina que...aqui costuma ser...Percebi um enorme impacto provocado pelo conjunto de factos presenciados com o ambiente, a luz, o reboar dos sinos, a atitude das pessoas também em visita...Algo de novo surgiu aos olhos da menina e gravou naquele coraçãozinho o que a levou a dizer-me em certo momento:"Estou tão feliz !"com aquele adocicado do falar brasileiro.Nunca esteve nos meus planos fazer qualquer espécie de proselitismo de trazer por casa mas quem ficou muito feliz fui mesmo eu, porque, ao regressarmos a Lisboa, todas traziam no rosto um brilho feliz que é mais eloquente do que muitas palavras. Até a minha amiga mais velha vinha descontraída e leve. Como eu !... E para o Brasil vão voar, daqui a dias, uma, duas ou três dezenas de fotografias que mãe e filha tiraram para mostrar ao pai que não veio e não viu, ele sim brasileiro, católico, praticante, na Fé que é também Amor...

21 julho 2007

Rosalia de Castro







Que es soledad ?
Para llenar el mundo
basta a veces un solo pensamiento...

10 julho 2007

LISBOA

Lisboa à beira da barra,
Lisboa à beira de mim,
Meu rio, barco e amarra,
Ida e volta, meu sem-fim...

Minha Lisboa ! Nunca assim falei da cidade que é minha mesmo, como é convencional dizer.se da terra onde se nasceu. A minha terra é Leiria.Esta é uma realidade que endossei mas que não sinto correr.me nas veias. Pelo afecto essencial, pela aderência física, pela génese das memórias, pela imanência espiritual, pelas cumplicidades culturais, eu tenho aquela terra que me tem, plena e despreconceituosamente, e essa terra é Lisboa. Nela fui menina e mulher, nela amei, nela sofri, com ela aprendi códigos e tradições, Nela FUI.Nela ESTOU SENDO. E estou tentando acompanhá-la nas vicissitudes do seu desenvolvimento, ou, melhor dizendo, do seu crescimento. Porque Lisboa mais tem crescido,em comprimento, largura e altura, não sendo bem a isto que se chama desenvolvimento. Passando por muitas mãos executoras das ideias, opiniões, credos políticos, ou mesmo convicções de muitas cabeças pensantes, Lisboa arruinou-se, remendou-se, engalanou-se, endividou-se e continua linda a seduzir-nos com as suas claridades e os seus lusco-fuscos, com os seus altos e baixos, praças largas ou recantos esconsos, modernices ou antiguidades... Suponho que é por estas razões todas que se encarniçam os políticos quando,democraticamente, vai a votos a governação desta linda cidade-mulher( como diz aquele fado ) . Desta vez há nada menos do que doze candidatos pretendendo governá-la, cada qual acreditando que conhece o segredo de a tornar melhor, mais europeia, mais rica...diferente. Estive a ouvi-los e ficou.me um travo na garganta, uma inquietação mal definida... Que Lisboa, senhores, que LISBOA será essa, senhores, que nos querem dar, a nós que amamos esta tanto ?...

08 julho 2007

7-07-2007

É curioso como nós sentimos que, quanto mais vamos avançando na idade, menos os outros nos vão conhecendo, mas também menos nós vamos tendo necessidade de nos darmos a conhecer.
Confesso que é até um certo prazerzinho perverso o apercebermo-nos de quanto se estão a enganar a nosso respeito ao atribuirem-nos gostos, qualidades, defeitos, manias, que já poderão ter-nos qualificado alguma vez, numa vida que ficou para trás, mas que, no momento actual, tiveram a sua deriva natural e são já outros... É que se vai perdendo tanta coisa com o andar da vida, que é com uma espécie de avareza que nos resguardamos e guardamos só para nós este tesouro de, afinal, não sermos bem aquilo que eles pensam saber de nós...
Tudo isto me ocorreu agora, justamente pela contrária! Houve quem se lembrasse do meu fascínio pelos veleiros que é de sempre e, este, perdura. Levaram-me pois a vê-los, agora que se está a realizar o Campeonato do Mundo dos barcos que irão depois às Olimpíadas. Naquele mais mar que rio e ainda rio a encontrar o mar, de Cascais para o Guincho, é deslumbrante a presença das velas, a sua leveza e a sua capacidade de tornear os ventos, uns ventos ferozes, desabridos que podem ser desafio mas que também lhes podem ser indispensáveis... Todo este encantamento puramente estético da minha parte tem que ver com uma nunca satisfeia ambição de espaço aberto, de liberdade que não significa isso de que se fala e que eu creio que só quem anda no mar é que conhece.
E porque o vento era um excesso, e porque tivemos que estar sempre dentro e por detrás de vidros embaciados de sal, regressámos a outros confortos.
Tinhamos todos na cabeça a data de 7-7-2007. Uma incessante campanha produziu os seus efeitos e ninguém podia deixar de estar curioso pelo resultado de duas auscultações, uma só aos portugueses, outra a todos, de todo o Mundo, para que, sob um colossal consenso, o Mundo e o nosso país passassem a ter os seus Colossos de Rodes ou os seus Jardins suspensos de Babilónia... Uma estação de televisão fez a festa estrondosa e conheceu-se resultados no meio de muita música, muita luz, muita cor... Por acaso(seria?) uma outra estação de televisão fazia-se eco das enormes preocupações ambientais que, ameaçadoras, nos aconselham comedimento e engenho para poupar. POUPAR tudo, senão... Assim, encantada com o que me pareceu um bom prenúncio de possibilidades de entendimentos mundiais, desde que o que suscita esse entendimento seja reconhecidamente uma mais-valia para a Humanidade, não consegui contudo libertar-me da angústia de compreender que o ESPAÇO de cada um de nós está, minuto a minuto, a ficar mais restrito, sem que muitos de nós nos apercebamos disso...