13 dezembro 2007

Passou hoje a haver um Tratado de Lisboa

Lembro TORGA . Hoje a grande notícia não fui eu...
Aqui,neste país e nesta hora.Aqui,junto dos meus, mortos ou vivos...
...ver esta maravilha: meu Pai a erguer uma videira, como uma Mãe que faz a trança à filha...


O que me foi dado ver na televisão, esta manhã, foi uma Lisboa lindíssima,iluminada com a sua mais deslumbrante luz, muito branca nas pedras antiquíssimas debruadas de azul aqui e ali, pela mão de alguém que mais pareceu realmente amar muito esta cidade, tanto, tanto, que só pensou em mostrá-la bonita às visitas que vieram de todas as partes... Vinham pela política, pelas conveniências, pelas "tricas", por tudo, menos pelo Amor, mas era vê-las saírem dos respectivos carros e desanuviarem-se-lhes os semblantes que traziam fechados ou distraídos... Alguém arranjara Lisboa, ali,encostada ao Tejo, "COMO UMA MÃE QUE FAZ A TRANÇA À FILHA" e era ver os sorrisos e os braços abertos, em gesto de abraçar, de toda aquela gente que, de cores transparentes , resplandecentes, apenas sabia de ouvir falar,certamente, através de espessas paredes de cinzento...
Hoje a Lisboa que eu amo estava ali. E a grande notícia foi ela, deixando-se amar...
Quando destas partes se partiu um dia, muita coisa veio a tornar-se diferente "URBI ET ORBI"!

06 dezembro 2007

ISAÍAS

Deixe o ímpio os seus caminhos e o pecador os seus projectos;volte-se para o Senhor,que terá piedade dele,para o nosso Deus que é generoso a perdoar.
"Os meus planos não são os vossos planos,nem os vossos caminhos são os meus caminhos_ diz o Senhor_;quanto os céus estão elevados acima da terra,tanto se acham elevados os meus caminhos acima dos vossos e os meus planos acima dos vossos planos"


Gosto de ficar a pensar quanto sou pretensiosa quando imagino que Deus
está a fazer qualquer tipo de "avaliação" com bitolas iguais às minhas...
O nosso sistema de contas,pesos e medidas criámo-lo nós de acordo com as
nossas dimensões.Não sou capaz de imaginar,à dimensão divina, o quanto,
seja do que for...

02 dezembro 2007

Este mês de Novembro, se algures há um contador do tempo das nossas vidas, devia-me ser descontado nos totais de algum dia, porque na verdade tenho a sensação de que o não vivi, ou de que ele não me permitiu que o vivesse. Passaram os Santos e os Fiéis Defuntos, partiu a Côrte para o Brasil, morreu Fernando Pesssoa, e eu, agarrada a uma tradução que prometi a alguém, fui deixando escorrer os dias a pensar em coisas que nunca tinham entrado na intimidade das minhas ocupações e que, por isso mesmo, chegaram a alienar-me completamente, pela novidade, pela variedade, e pela alteridade...Numa espécie de assombrações do meu mundo a fazer-se presente, surgiam-me, pelas tardes ,Camões a divertir-se em voltas de redondilha menor, D. Manuel deSousa Coutinho a pegar fogo à sua casa, e a Tlebes em toda a sua pujança a radicar-se por entre quase inofensivos grafitti, tão significantes quanto um código o pode ser.
E foi por entre tudo isto que tomei conhecimento daquilo que, de repelão, me fez pôr de novo os pés em terra.E não foi o renascer das quase-cinzas do acordo ortográfico luso-brasileiro...Foi algo que tem a ver com a Língua,sim senhor, a Língua que o Poeta dizia ser a nossa Pátria. Ergue-se BOLONHA,quando muitos de nós andávamos distraídos, e agora os alunos entram nos Mestrados e eis que as aulas são dadas em INGLÊS! E os testes são escritos em inglês. Os comentários preocupadíssimos que tenho ouvido de alunos,por exemplo, de Economia !!! Quase todos sabem algum inglês mas não têm desembaraço naquela área de vocabulário e muito menos escrito... Bem!...Como foi que tudo isto e muito mais foi acontecendo ?
Creio que nunca me pareceu tão bemvindo o DIA da RESTAURAÇÃO da INDEPENDÊNCIA,um 1º de Dezembro cinzento e meio envergonhado,com as pessoas do costume a fazerem e dizerem as coisas do costume, mas comigo a ver as coisas já não com os meus olhos do costume...

24 novembro 2007

Proximo ADVENTO

Eis senão quando...apercebi-me de que o mês de Novembro tinha voado. O domingo do próximo fim-de-semana já será o primeiro domingo do Advento. E,havendo para mim partes do ano em que o gosto de viver se me torna mais intenso, o Advento é uma delas. A primeira. A outra, a segunda, é a que abrange as doçuras dos fins de tarde de Outubro e os nevoeiros sobre os velhos plátanos dourados de Novembro. Não me sinto harmoniosamente viva em mais nenhuma outra época do ano. Todo o ADVENTO me permite ainda hoje esperar. Aquelas brincadeiras de adolescentes dos ela ainda acredita no PAI NATAL ! ,assentar-me-iam como uma luva,porque SIM, acredito no sonho, acredito com toda a força da minha alma nas imensas perspectivas que se abrem para alguma vez...acredito na FÉ( isto é,será?,um pleonasmo). E cheiro, saboreio, quase apalpo este fluido de mistério que a minha sensibilidade capta nesta época.Não tem nada que ver com esse turbilhão das cidades, com essa loucura de trocar presentes ao desafio,com essas ostentações de roupa nova, com essa afronta das comezainas... É tudo entre mim e mim mesma.Será porque tenho de Deus muito, dentro de mim.?E há cânticos e encantamentos inesperados...E os silêncios parece que nos roçam pela pele com farrapos de lembranças...E às vezes surge um amigo que vem dos longes de não nos vermos nunca e iluminam-se uma data de mais esperanças...No friosinho entre murmúrios duma ida à MISSA do GALO começa o fim do encantamento. Quando vem o Dia de Natal é como noutros tempos entrar nos luxos BARROCOS.
Vou então acender as quatro velas, aligeirar tudo o que me é obrigatório,libertar-me para este mistério e vivê-lo com todas as minhas forças !

11 novembro 2007

Guiness book

Hoje foi São Martinho.
Nem castanhas,
Nem vinho,
Nem meia capa do Santo,
Nas formas habituais...
Já não há frio, parece,
porque os verões,agora,
são globais...
Quem lembra essas coisas esquece
e não entra mais
na História..
Lenda mesmo é o meu espanto:
Um São Martinho em GUINESS ? ? ?...

04 novembro 2007

Do jornal agora

Mais uma vez feriados encostados a fins de semana e alongados com "pontes"... Os portugueses, em Portugal, sempre tiveram pouca consciência de que, a produzir, a trabalhar cada um naquilo que melhor sabe fazer, engrandeceriam o seu país sem precisarem de grandes esfalfamentos.O sonho de uma vida de reformados ricos sempre pairou nas ambições de quaisquer trabalhadores que conheci ou de que ouvi falar. A juntar a este sonho, surgiu, creio que por volta dos anos sessenta, a verdadeira fixação dos portugueses pelas idas à praia mais ou menos durante todo o ano, mesmo que faça algum frio e mesmo que "a praia" não exista ali ao virar da esquina. A Serra, o pinhal, o "campo" deixaram de ser atractivos, vá-se lá saber porquê...

E esta atracção por tais padrões de vida, não fazendo muito alarido, acabou por influenciar um sem número de coisas da nossa vida quotidiana, descaracterizando um modo português de viver, tornando-o híbrido, imitativo e despesista.

Tudo isto me ocorreu a partir desta extraordinária maratona que consiste em ler os jornais de fim de semana. São quilos e quilos de papel, repositórios de um sem número de separatas, umas mais publicitárias que outras, tentando todas captivar a atenção do leitor que, provavelmente, já não se sentirá tão atraído pelas notícias, uma vez que elas já nem sequer desenvolvem as que a TV vai debitando durante a semana, provenientes que são, todas das mesmas agências noticiosas . No meio de cada feriado e ponte que proliferam na nossa terra, é sem dúvida uma árdua tarefa esta de ler os jornais. E o tempo escorre veloz, mesmo que só façamos leituras oblíquas para "escolher" o que ali vem que nos interessa ou convem ler. Lá se vão algumas páginas de um bom livro que teríamos podido estar a ler, não fosse o desejarmos ficar ao corrente do que de mais actual vai por aí, pelos arredores das nossas frustrações.

E como parece que o que vem nos jornais é que importa, "pensaram"as cabeças pensantes( que decidem o que, de futuro, todo o português deve saber), que há que dar lições de jornalismo aos jovens que, na escola, ainda mal sabem distinguir a prosa da poesia...
Ensina-se-lhes o quê,como,onde e porquê e depois dá-se-lhes, como trabalhos de casa ou testes para nota, a fabricação de notícias com obediência a todas as regras adjacentes.

É conhecida a relutância que os nossos rapazes e raparigas têm pela leitura de qualquer livro e então estimulam-se na exploração da literatura jornalística. Daqui a distinguirem um "Editorial" de uma "Crónica" e a analisarem uma" Entrevista"vai toda uma panóplia de conhecimentos que eu não sei quantos deles irão mais tarde sequer recordar, quanto mais utilizar...

E não posso deixar de perguntar-me : Que haverá de inconveniente nos nossos maravilhosos escritores? Esta cultura de feriados e pontes estará também a roubar-nos o tempo para eles até que os vamos deixando cair?...



...

.

02 novembro 2007

O dia de todas as memórias


FLORES para todos os que amei e hei-de amar...

E agora sei que está nesse amor a eternidade...

01 novembro 2007

Dia de todos os santos

"Felizes os obreiros da paz, porque hão-de chamar-se filhos de Deus "

26 outubro 2007

Eugénio de Andrade:
Correr do tempo ou só rumor do frio
onde o amor se perde e a razão de amar;
– surdo, subterrâneo e impiedoso rio ,
para onde vais sem eu poder ficar ?

Miguel Torga:



1– Remendo o coração, como a andorinha
remenda o ninho aonde foi feliz.
Artes que o instinto sabe ou adivinha...
Mas fico a olhar depois a cicatriz.

2– Na sina que me foi lida,
este dia é sempre assim:
Sol na paisagem da vida,
e sombra dentro de mim.

23 outubro 2007

Fait-divers

Às vezes o dia a dia da vida numa grande cidade traz- nos os chamados faits-divers que nem sempre são trágicos na sua superfície visível e que até nos podem fazer sorrir, por muito desencantados que tenhamos saído nesse dia. Este, que me foi relatado "na hora", até permite construir uma pequena fábula dos tumultuosos tempos que estamos vivendo na cidade.
Sete e meia da manhã, lusco-fusco, e um autocarro cheio com as pessoas de profissões "menores", que são as que se movimentam de autocarro a horas destas. Num dos bancos perto da porta senta-se uma jovem vistosa de roupas , adornos e penteados .Há agora uma espécie de tranças feitas de lã, fininhas e coloridas, que as raparigas introduzem nos penteados como se fossem extensões e as enfeitam, caindo sobre um ou os dois ombros ,ligeiramente mais longas do que o cabelo. Pois a nossa personagem tinha também dessas trancinhas. O autocarro pára e,correndo como loucos, dos bancos lá de trás, saltam dois rapazes para a porta, um deles atira as mãos aos ouros da rapariguinha, ela leva as mãos ao pescoço e grita ... e eles já correm, voando rápido, rua fora...Tudo cronometrado a fracções de segundo...No meio do borborinho dentro do autocarro, " ai o ouro!" "e para que é que trazem aquilo tudo ao pescoço?" "é p'ra aprenderem..." ,ouve-se meio sumida a voz da jovem beleza assaltada: "levaram-me a minha rica trança !"... MUCH A DO FOR NOTHING!!!

20 outubro 2007

Ortega y Gasset-de La Rebelion de las Masas

HABLAR es una operación mucho más ilusoria de lo que suele creerse, por supuesto, como casi todo lo que el hombre hace. Definimos el lenguage como el medio que nos sirve para manifestar nuestros pensamientos... ... Lo de menos es que el lenguage sirve también para ocultar nuestros pensamientos, para mentir. La mentira seria impossible si el hablar primário y normal no fuese sincero. La moneda falsa circula sostenida por la moneda sana. A postre, el engaño resulta ser un humilde parásito de la ingenuidad... ... Sendo al hombre impossible entenderse con sus semejantes, estando condenado a radical soledad, se extende en esfuerzos para llegar al prójimo. De estos esfuerzos es el lenguage quien consigue a veces declarar con mayor aproximación algunas de las cosas que nos pasan dentro. Nada más.

Cuando el hombre se pone a hablar, lo hace porque cree que va a poder decir cuanto piensa. Pues bien: esto es lo ilusorio. El lenguage no da para tanto. Dice poco más o menos una parte de lo que pensamos y pone una valla infranqueable a la transfusion del resto. Sirve bastante bien para enunciados y pruebas matematicas; ya al hablar de física empieza a hacerse equívoco y insuficiente. Pero conforme la conversación se ocupa de temas más importantes que ésos, más humanos, más reales, va aumentando su imprecision, .su torpeza y confusionismo. Dociles al prejuicio inveterado de que hablando nos entendiemos, decimos y escuchamos tan de buena fe, que acabamos muchas veces por malentendernos mucho más que si, mudos, procurásemos adivinarnos... ...En todo decir hay un emisor y un receptor, los cuales no son indiferentes al significado de las palabras y esto varia cuando aquelles varian ( duo si idem dicunt non est idem)... ... Se ha abusado de la palabra y por eso ha caído en desprestígio.... ...hablar a todo el mundo y a nadie... ...yo detesto...y sufro cuando no sé muy concretamente a quién hablo...

18 outubro 2007

A Palavra

Fazer um poema
não é só escrevê-lo
nem senti-lo.
Não é aquilo que pensam
de dizer-se o que nos vai por dentro,
de guardar no papel
um segredo
se não temos coragem de guardá-lo.

Nem tão pouco é vontade de exibir-se
na esperança de que alguém,
lendo-o, diga sentir-se
como nosso irmão,
tal a capacidade de comunicação !


Não ! Fazer um poema
pode ser mea culpa,
às vezes convulsão de sentimentos
entre alegrias e penas
e alguns arrependimentos...


Mas sempre, sim,principalmente,
uma imensa volúpia
de agarrar as palavras
e domá-las,
desdobrá-las
recriá-las,
pô-las contra a parede
ali , à prova,
de terem, sim ou não,
força bastante,
música,
mansidão,
rigor ou colorido
para dizerem, só e justamente,
aquilo que é de nós parte integrante,
sem probabilidades
de outro sentido...



Mística e transcendente, à palavra
é a mão que obedece docilmente
e o gesto que desliza no papel...


e ,se nasce o poema,
é misteriosamente,
e misteriosamente...

14 outubro 2007

Chorar em Fátima

Não é a mesma lágrima
de sempre !
Não é o mesmo sal,
a espessura, e o gosto...
Brota silenciosa,
devagar,
e começa a escorrer
por dentro da emoção,
a inundar-nos não o peito : a alma !

Não é a mesma lágrima.
isso não !
É um grito calado
a morrer-nos na boca...
E o amargo sabor
das dores do Mundo, todas...
Ali e só ali é que entendemos:
somos mesmo pequenos
e sem espaço
para um pequeno grão
sequer
de santidade...







!

09 outubro 2007

CARDAL _ a ponte

É sempre bom a mão amiga que se nos estende. Às vezes precisamos dela deseperadamente .
Nisto do dar e precisar, diz-se que quem precisa, precisa sempre e quem dá, não pode dar sempre. Se esta tão sábia sentença é verdadeira em termos de bens materiais,já não é tanto assim em termos da amizade, com o seu caudal de bens inerentes ( previsão,subtileza, desprendimento, paciência, aceitação, etc.,etc.) Sei, por experiência própria, que a mão amiga, a amiga mesmo, está sempre lá, onde eu a sei.Não pode,é claro, adivinhar as minhas situações de carência-desespero, mas algumas vezes houve já em que as previu e se me estendeu tão oportunamente que eu pensei que havia ali "feitiço"...
Estamos pois num aproveitamento de três dias de férias numa daquelas pontes que reis e santos tanta vez oferecem ao povo quando a data da sua celebração vai cair a jeito de desdobrar os dias chamados inúteis da semana. Desta vez, por acaso, até se celebrava o desaparecimento dos reis, precedido de acções nada dignas de se celebrar. Bem; mas foi feriado bom, brilhante, morno, sem vento, lindo ! E a casa da Teresa e do João estava lá, de braços abertos, à nossa espera, assim uma espécie de ilha de bem-estar e paz no meio de um mundo ruidoso e agressivo de que,na ocasião, estávamos cansados.Janelas abertas sobre o vale em cuja concha cintila o límpido azul das águas da albufeira fragmentada em vários braços reentrantes , envolvência de verdes em plena pujança, mesmo sendo outono, pios, grasnados, latidos longínquos, a enrolarem-se no marulho das ramagens,descida lenta do sol a desdobrar-se em incontáveis tons de rosa e lilás...e, da nossa parte, uma tão premente vontade de não mexer nem as pálpebras, não vá quebrar-se o encanto ! Uma premente necessidade de agradecer a Deus esta oferta inesperada de um mundo límpido que podemos guardar na alma...
Esperar silenciosamente
pelas coisas
sossegadamente...
Sabe de outra maneira
e é diferente
aquele acontecer
que não nos chega
atabalhoadamente...
E sentir que afinal algo espera por nós indefinidamente, indefinidamente...

08 outubro 2007

Dia de S. Francisco de Assis

IL POVERELLO !!!

"Onde houver ódio, que eu leve o AMOR
Onde houver ofensa, que eu leve o PERDÃO
Onde houver discórdia, que eu leve a UNIÃO
Onde houver dúvida, que eu leve a
Onde houver erro, que eu leve a VERDADE
Onde houver desespero, que eu leve a ESPERANÇA
Onde houver tristeza, que eu leve a ALEGRIA
Onde houver trevas, que eu leve a LUZ ."

"Fazei, Senhor, que eu procure mais consolar do que ser consolado, compreender do que ser compreendido, amar do que ser amado!"

01 outubro 2007

O Dia da Música

De la musique avant toute chose...É celebrado hoje o DIA daMÚSICA e logo no primeiro dia do mês no qual eu encontro todas as conexões com suavidade,doçura,apaziguamento, serenidade !
Nada daqueles entorpecimentos da geração que VERLAINE marcou com esta sua lei primeira da arte poética, mas um "estar bem" no mundo agora malgré tout... Parece-me de total inutilidade explicar aqui qual é a minha música uma vez que a incluo neste panorama do meu Outubro. Tive a sorte de me terem oferecido agora dois CDs de géneros bem distintos mas perfeitamente enquadráveis nesta tessitura das minhas horas de silêncios vitais : 14 valsas de Chopin interpretadas pela Mª João Pires e a Sinfonia nº 2 de Rachmaninov numa interpretação do maestro Temirkanov que faz com a Royal Philharmonic Orchestra absolutamente um festival. Já quase tanto, direi, como o Karajan quando pegava fosse em que orquestra fosse. Não se admirará ninguém de que uma pessoa com a minha idade não se entusiasme com os be- bop e todas as qualidades de pop com cujos barulhos a gente nova se embala, ou antes, se sacode. É a energia estuante que encerram nos seus corpos que precisa daquela válvula de escape . Por isso também hoje devem os jovens festejar a sua música. Lá chegará um dia em que também festejarão a minha...E como me irão então compreender!!!

28 setembro 2007

Passagem de Modelos

Chega o Inverno
e acolho-me no quente
das lãs
que quero fofas, levezinhas...
Sob os calores do Verão
é nas sedas, nos linhos
deslizantes
que a minha pele
encontra o arrepio
que a brisa empresta
às manhãs refrescantes...
Na minha Moda
o que é mais importante
é toda a contextura dos tecidos
e não a arquitectura dos vestidos !
É orgânico, é físico,
é carne e é sentidos !...
Frivolidade apenas aparente
na Moda, o inquietante
é que nos cobre o nu
mas ficamos despidos ...

20 setembro 2007

LEITURA

Uma das realidades com que se batem os pr ofessores de Português neste tempo em que vivemos é que os alunos não gostam, não querem,não se fixam a LER.
Portanto, para eles, ler um livro completo é algo de impensável. Claro que estou cansada de procurar fazer um levantamento das razões por que tal fenómeno se gerou e se fixou, mas o conhecê-las não me ajudou em nada para a descoberta da melhor maneira de as combater. E então o que me espanta é a ingenuidade ( ou será apenas hipocrisia ? ) com que nos programas oficiais surge uma “coisa” chamada CONTRATO DE LEITURA pela qual os professores vão procurar comprometer os seus alunos a lerem, ao longo de um prazo de tempo contratado , um ou mais livros que ou eles próprios indicam, ou vêm já sugeridos no manual. Será uma tentativa e até podia vir a colher alguns frutos...Mas, para meu grande pasmo, os livros sugeridos são muitos de autores estrangeiros nem sempre representativos de alguma coisa útil e com traduções nem sempre exemplares. Há sugestões, por exemplo, para HARRY POTTER...
E é perante um panorama destes que, quase em simultâneo, nos aparecem duas notícias felizes no âmbito da Literatura Portuguesa..No meu tempo de escola lia-se AQUILINO RIBEIRO e na obra vastíssima os romances prendiam , da primeira à última página. Era eu que já gostava ou seria mesmo o seu modelo que também me estimulava para a utilização de uma língua escrita especial e diferente da de todos os outros escritores que eu conhecia ? Bem, com uma enorme polémica à mistura, as ossadas de Aquilino vieram agora tomar lugar no Panteão Nacional. Temos motivo para nos orgulharmos porque estão pensando em gloriar um expoente da língua nossa tão amada trabalhada com tal mérito que até não teria sido demais se o seu autor tivesse recebido um Prémio Nobel.
A outra notícia vem da Alemanha onde ANTÓNIO LOBO ANTUNES esteve presente num Festival de Literatura em Berlim onde foi apresentado como “ o maior escritor português da actualidade “ e foi longamente aplaudido por uma enorme assistência. Num post que escrevi quando lhe foi atribuido o Prémio Camões, no mês de Março, podem ler-se as razões do meu contentamento por esta notícia de agora.
É minha obrigação falar de tudo isto aos meus alunos. Conseguirei que desistam de ir procurar onde se vendem os famosos resumos que proliferam como cogumelos nas sombras das grandes árvores ?

14 setembro 2007

Um novo ano lectivo

...e aí estão eles ! Já vieram, como as andorinhas vêm anunciar a chegada da Primavera.Uns telefonam primeiro, outros vêm de surpresa, com um sorriso maroto e com o ar de quem vem apanhar-me em qualquer actividade misteriosa; mas há os que vêm com a Mãe ou porque vêm pela primeira vez, ou porque as Mães são senhoras simpáticas que passam todo o ano lectivo a falar-me pelo telefone( sempre na hora de jantar e sempre um pouco a correr) e aproveitam esta abertura para virem estar um pouco comigo. E trazem-me chocolates, flores, livros, perfumes, écharpes... Isto tudo acompanhado de uns olhares ansiosos fixados na minha cara, atentos à minha mínima reacção, porque eles sabem que eu reclamo sempre com este assunto dos presentes e, acham eles que, vindo das Mães, eu talvez me comporte... Claro que os adoro. Estes meninos ou rapazes e raparigas são o estímulo que à minha idade ainda vai sendo permitido. De muitos deles, já fui professora da Mãe e até da Avó...Mas vêm os da Paróquia ou outros a quem falaram de mim...São todos os meus meninos, mesmo quando já estão com um pé nas Faculdades. Luto ao lado deles uma luta cujas armas eu vou tendo que adaptar ou mesmo criar, consequente das suas fraquezas ,das suas capacidades e das peculiaridades dos professores que cada um tem, nas respectivas escolas. Usei a palavra "luto" porque, na verdade, a sequência escolar, nestas épocas de instabilidades várias, como ultimamente vem sendo, toma proporções de um verdadeiro combate no qual os jóvens se podem perder sem mesmo disso se darem conta. Para isso, eles sabem que contam comigo. Ensinar a amar é qualquer coisa que tem que ver com a alquimia ou então com o Divino.E eu pretendo ensiná-los a amar : a sua língua, a sua História, a sua literatura, os seus escritores...e todo aquele todo que é afinal a ALMA da sua Pátria. Assim Deus me ajude ! VAMOS COMEÇAR !

09 setembro 2007

Porquê um blog ?

Que quero eu com este blog ?É apenas um exercício de escrita? Pressupõe este um arrumar de ideias? Ou é antes um arrecadar de ideias, através de um exercício de escrita? Não será antes um substituto daquele interlocutor ou daquela companheira “de route” que tanta vez me falta para só falar, falar para dizer coisas, falar para me ouvir sobre coisas...?
Fui educada em discrição, poucas palavras, ausência de palavras “pequeninas”, que é o nome que eu dou às palavras mimosas, de mimo mesmo. Trouxe portanto para a vida prática um vocabulário seco, estrito que depois fui aprendendo a enriquecer com as belas adjectivações , metáforas e ironias dos meus autores estudados, preferidos, alguns. E , nesta espécie de autodidatismo, comecei, muito novinha a impressionar-me muito , nas leituras do Novo Testamento, com a dureza das falas de JESUS. Há certas pasagens em que,à luz da educação que recebi, Ele chega a tocar as raias da má educação, na forma como fala à MÃE ou aos Pais. E como isso contrasta com os diminutivos amorosos que utilizam os autores das variadas Epístolas para se dirigirem aos pagãos que queriam cativar ! Creio que as contingências da maioria das traduções que nos vieram ter às mãos têm muito a ver com isso, mas será impossível, no entanto, deixarmos de ouvir Jesus dirigir-se à MÃE usando o vocativo “mulher”, tal como o usa para chamar a prostituta prestes a ser lapidada, ou a pobre doente que o persegue para que a cure.Diz-nos o Evangelho que Nossa Senhora via crescer o filho “em graça e sabedoria” e “Tudo guardava no seu coração”. Também ensinou assim as mulheres a erguerem nos seus corações os mais secretos templos de amor não exteriorizado...
E por aqui comecei hoje, na sequência das leituras da missa em que, por muito que as homilías quisessem adoçar, para nós ficou nitidamente claro que Jesus nos exige ,muito
concretamente, o abandono radical de toda e qualquer fraqueza humana de coração, para podermos segui-lo.DIFÍCIL !!!
Tanto mais difícil para mim esta semana PORQUE : 1- recebi visitas e recados com provas de tanto gostarem de mim, que foi inevitável aquele calorzinho no peito, que vem do orgulho; 2 - vi um filme na TV ( coisa que não é de meus hábitos) de que muito gostei porque me veio fornecer provas de coisas que eu sozinha tinha equacionado e além disso era um notável trabalho de actores; 3- tendo recebido a notícia da morte do “GRANDE” Pavarotti não me foi possível furtar-me a um reviver de muitas coisas lindas a ele ligadas pela sua espantosa voz e evitar uma ou duas lagrimitas, talvez piegas, talvez! ; 4- dona de casa à maneira de minha Mãe, ainda organizo, com a insubstituível Valentina, umas limpezas anuais à minha casa, às quais eu chamo “grandes manobras” e que me permitem ,em cada ano, verificar de quanta coisa inútil estamos nós rodeados, ao fim de tantos anos de vida nossa e de perda de vidas queridas , das quais as pequenas e grandes inutilidades envolventes acabaram vindo “desaguar” na minha envolvência ,fazendo da minha casa uma enorme acumulação de “teres” dos quais é preciso cuidar ,Deus sabe com quanta canseira...
Como ,com tudo isto, obter o tal abandono radical que certamente faria de mim uma pessoa infinitamente livre?
Então assaltou-me a ideia do blog, com que comecei. Será também para isso um blog...Um pouco como o canavial das canas do conto do Principe com Orelhas de Burro...

02 setembro 2007

É SETEMBRO

Extracto de Enfants de Septembre
de Patrice de la Tour du Pin

....je suis un enfant de Septembre,
moi-même, par le coeur, la fièvre et l'esprit,
et la brûlante volupté de tous mes membres,
et le désir que j'ai de courir dans la nuit
sauvage, ayant quitté l'étouffement des chambres...

Mais les bois étaient recouverts de brumes basses
et le vent commençait à remonter au nord,
abandonnant tous ceux dont les ailes sont lasses,
tous ceux qui sont perdus et tous ceux qui sont morts,
qui vont par d'autres voies en de mêmes espaces...


De Salvatore Quasimodo, traduzido por Ernesto Sampaio

E DE REPENTE É NOITE

Cada um está só, sobre o coração da terra
trespassado por um raio de sol:
e de repente é noite !

28 agosto 2007

DORNES


...E quando eu já vinha toda cheia de lirismo acolchoado em todos os prazeres daquele impres-
sionismo que tem sempre as minhas preferências tanto na pintura, como na música, como nos Cesários pelos quais me apaixonei, acontece o tristíssimo episódio do falecimento do EPC que desviou do meu espírito toda a capacidade de encantamento com que Deus me dotou. E é aqui que entra algo que eu reputo de extraordinário e me é dado, assim, de bandeja, como soe dizer-se, pela net. Sento-me em frente do meu computador, completamente vazia, posso dizê-lo. E, recordando os meus passeios em férias, lembrei-me de que talvez a net me pudesse dar alguma informação histórica e sociológica sobre a vila de DORNES que, para mim fora já uma descoberta noutras férias e agora revisitara com um ainda maior enamoramento. De busca em busca, apresenta-se-me então, nem mais, nem menos do que um BLOG elaborado por apaixonados dornenses reunidos em torno de uma acesa disputa sobre a categoria autárquica da sua lindíssima terra.
E lá estava tudo e ainda mais , daquilo que eu procurava, um pouco por desfastio, naquela ocasião.Não resisti a apropriar-me de uma ou duas belas fotos sabendo como dificilmente obtemos bons angulos numa terra muito recortada como é Dornes.Vou tentar mostrá-las aqui,recomendando, no entanto, o Blog SALVEM A VILA DE DORNES.

25 agosto 2007

De vez em quando somos apanhados numa curva do caminho pacato que iamos percorrendo e desaba sobre nós, amarga, aquela imprevisibilidade, aquela instabilidade que, a toda a força, passamos a vida a querer esquecer ou disfarçar para podermos dar à nossa vida alguma alegria, algum estímulo.´Cristãos e Católicos temos o dever de não esquecer que o Filho do Homem virá na hora em que menos pensardes e que, como às jovens esposas da parábola, nos é recomendado :vigiai pois, porque não sabeis o dia nem a hora ( Evangelho de São Mateus,24 e 25). Somos porém pouco dados a estas meditações, mesmo sabendo-as tão verdadeiras como mais nada neste mundo ! Ora estava eu há uns dias bastante irritada com o que o Eduardo Prado Coelho tinha publicado na altura do centenário de Miguel Torga, apetecendo-me discutir com uma certa ironia as opiniões por ele expostas,e estava ele já tão doente, tão doente, que hoje veio a falecer...A notícia da sua morte caiu no final do meu almoço. como bomba arremessada pelo jornalista da televisão. Conheci os pais do Eduardo,foram meus colegas, assisti ao namoro, depois ao progresso rápido do Jacinto que,mais antigo e já assistente, chegou a dar-me aulas, soube do casamento e depois do nascimento do bébé...Nunca perdi de vista a carreira do Eduardo. Uma vez encontrámo-nos em Sintra, ambos na recepção de um hotel onde iamos estar uns dias.Falámos um pouco de tudo e, nessa altura, ele já estava em Paris e estava casado,claro. Era um rapaz simpático, muito gordo, a resplandecer bem-estar consigo próprio. Era,pelo menos, tão inteligente como os Pais. Viamo-nos por aí,às vezes, em eventos do nosso interesse comum: livros e Letras. Fiquei muito chocada por os meus mais próximos últimos pensamentos para ele serem da natureza que foram. Mas creio na compreensão algures...

24 agosto 2007

Regresso

Como é que, na minha idade , ainda se regressa de férias(mesmo que pequeninas) com tanto entusiasmo renovador para banir alguns hábitos, para encetar outras formas de fazer ou dizer, para começar mesmo qualquer coisa não tentada antes, para largar uma pele, qual crisálida boasinha ou serpente traiçoeira ? Lembro-me perfeitamente de voltar de São Pedro de Moel, no tempo em que férias eram enormes espaços entre anos lectivos, com a cabeça a fervilhar de projectos, com um arrebatamento mal contido para contar como fora e como iria passar a ser tudo aquilo que o estimulante ar do mar e do pinhal me tinha levado a planear...Diga-se , em abono da verdade, que as companhias, a convivência descomprometida, o deixar abrir em leque tudo o que podia dissecar sobre fosse o que fosse , com outros que não eram “os de todos os dias”, me abria as portas todas, por onde a minha jovem curiosidade desejava entrar...E parece-me que é por aí que ainda germina o que, nesta idade, me traz de volta para casa com uma vigorosa sensação de poder renovar, de ser capaz... Isto, para dizer quão feliz me torna a convivência com os meus amigos que me recebem em sua casa, como se não “recebessem”, fazendo-me sentir “de lá”. É que assim se abre um enorme hiato entre o que eu estou cansada de ser e aquilo que, com eles, me parece que sou... E então quero “ser” essa que afinal tem uma casa onde se sente tão bem, que fica só, mas não é mau porque dá para pensar, que se acolhe dentro das suas rotinas como quem retorna ao útero materno...Estranhíssima maneira de tudo mudar, deixando tudo na mesma, não é ? Espantoso efeito destas deliciosas férias ! ! !

14 agosto 2007

Férias

Chegou hoje o dia de abandonar as minhas viciantes rotinas para ir passar uns dias em casa dos meus amigos Teresa e João que fazem questão de oferecer-me ...hospitalidade na sua belíssima casa, plantada entre pinhais, numa vertente que escorre para um dos braços reentrantes em que se desmultiplica a enorme albufeira do Castelo de Bode.É uma paisagem de paz que contagia todos os habitantes da casa onde parece que é proibido inquietarmo-nos uns aos outros...Quem quer e pode, além de dormir,"retoiça" na piscina, estira-se na relva ou faz umas incursões exploratórias até à água da barragem. Sem falar no enorme prazer das longuíssimas conversas, moles, sem pressas, que podem ocorrer a qualquer momento do dia ou da noite, acontecidas a talhe de foice do que diz qualquer dos amigos presentes...Férias mesmo !E lá vou eu...

13 agosto 2007

Baptizado

Não posso, não quero, passar por cima do registo daquilo que foi a coisa mais enternecedora, mais engraçada, e, ao mesmo tempo, mais cansativa de tudo o que podia ter-me acontecido neste mês de Agosto. No dia 11, data marcada com antecedência de meses, foi a baptizar na igreja da minha paróquia do Campo Grande a primeira neta da minha empregada Valentina. Este baptizado foi projectado e programado até ao mais insignificante pormenor pelos pais da criança, emigrados no Luxemburgo, e por toda a família de cá, da parte do pai e da mãe da baptizada; e o espírito da festa foi alastrando como uma onda espraiada por toda uma família em diáspora por essa Europa fora...Claro que,para a "minha" Valentina, era impensável que eu não tomasse parte naquela que foi certamente a festa da vida dela. E eu não tinha olhos , nem sorrisos, nem emoção que bastassem para me maravilhar, naquele dia, com o que pode ser o verdadeiro amor de família, o espírito de comunidade de famílias de sete e onze filhos, todos dispersos, a acorrerem a um toque a reunir emanado de um país distante, porque um deles está feliz e quer que todos partilhem da sua felicidade!A cerimónia na igreja foi seguida com todo o respeito e cumpriram-se todos os actos tradicionais que acompanham a chegada de mais um cristão à casa do PAI.Quando, porém o senhor padre António sugeriu que se festejasse com um bonito coral de "parabéns" e muitas palmas esta chegada da ALÍCIA a mais esta enorme família cristã, foi uma explosão de alegria geral que só deixava prever como a alegria iria reinar daí para a frente. E foi. Nem quero falar na festa-banquete. Tudo o que é especialidade caboverdeana,tudo o que nos vários países onde vivem uns e outros foram aprendendo. tudo o que de Portugal já entrou nas tradições daquele povo, nada faltou.Foi uma orgia gastronómica! Num espaço amplo,cercado de jardins, cerca de trezentos parentes estiveram comendo e bebendo longamente,alegremente, e não vi um único deslize, algum abuso de bebida,alguma perda de compostura. Precisavam certamente de expandir as emoções dos encontros ? Pois foi assim que se entrou na dança e daí para a frente foi soberbo! Só quem já viu o povo caboverdeano dançar as suas próprias músicas,sabe da beleza de um tal espectáculo.A música parece que encarna naqueles corpos elegantíssimos de raparigas e rapazes e há uma mistura de movimentos e sons envolvente, inebriante... A vê-los, acabei por ficar tão cansada como se estivesse no centro daquela espécie de vórtice.Foram emoções a mais para quem, como eu, tem uma rotina serena e quase sem novidades. Mas um dia inesquecível com imensas lições que não podia supor ir ali receber.Estou mais uma vez grata à "minha" Valentina !

12 agosto 2007

Miguel Torga__100 anos

A minha ligação familiar com Joaquim Guilherme Gomes Coelho(Júlio Dinis) nunca me fez experimentar uma proximidade tão afectiva como a que sempre me prendeu a Miguel Torga a quem apenas me ligaram umas dúzias de palavras escritas e trocadas numa sempre cerimoniosa cordialidade.Foi ele quem indicou a meu PAI,numa conversa de amigos comuns dos dois, em COIMBRA, uma editora que ele acreditava que aceitaria de bom grado publicar a minha primeira meia dúzia de sonetos que eu ensopara da influência de Florbela e achava bons para mostrar.Foi ele quem, uma vez publicados os tais sonetos, teve a paciência de me escrever umas palavras de estímulo e alguns conselhos sobre as vicissitudes a que fica sujeito quem alguma vez decide editar. Tantos anos passados,tenho verificado que,nos compêndios dos meus alunos, Torga é sempre atirado para um muito recôndito plano, como se não valesse muito a pena sequer lê-lo, quanto mais estudá-lo. E qual não é o meu espanto quando há dias leio um artiguinho de Eduardo Prado C oelho no qual, aliviando a consciência a dizer bonitas coisas sobre o cidadão irrepreensível,corajoso , intransigente, e digno,se permite dizer que"por motivos que não serão fáceis de explicar, a obra poética de Torga nada tem a ver com a poesia que hoje se escreve em Portugal". .Diz mais "os seus versos deixam-me quase sempre num estado de indiferemça e nunca me dão o prazer da leitura..."Como assinante do Jornal de Letras, fiquei feliz ao verificar que este jornal dedicou a Torga e ao seu centenário quase todo o número de 1 de Agosto,mas Prado Coelho,sob a diplomática capa de achar isto justo em termos de história literária, não resiste a dizer que"num contexto intelectual não muito estimulante, o aparecimento das obras de Torga e até de Régio foram uma novidade tão retumbante que .em termos só de história literária ,valia a pena o relevo dado pelo Jornal de Letras.E pronto ! Fiquei então agora mesmo a saber que a intelectualidade estimulada não gosta de Torga e o considera um poeta( ? ) de 2ª que ficou a dever alguma notoriedade principalmente à época política em que apareceu tão corajoso e digno a dizer algumas coisas que mais ninguém dizia. Bem, isto daria para armarmos uma interessante polémica, se , em vez do filho se tratasse do pai Prado Coelho de quem fui aluna e que recordo com respeito. Por agora quero apenas afirmar com toda a força que amo oTorga a ponto de ter a ousadia de sonhar seguir o seu modelo. Realmente a poesia que hoje se faz em Portugal,marca uma época nova, mas não vamos desgostar-nos de Camões só porque tivemos a graça de encontrar Sophia... E, do tempo dos sonetos, quero mesmo deixar aqui o que se segue:
A MIGUEL TORGA

Homem inteiro és.Na tua fé
a mesma seiva pura que há na terra.
Quando, junto de ti, a Vida erra,
sofres por ela ser tal como é.

Sofres.Descrês.E blasfemas até.
É o não poderes nada que te aterra.
Mas na crença no Mundo que te encerra
é que tu, naufragado, encontras pé.

Irmão de homens e plantas e animais,
podes ,nos teus penhascos ver ainda
promessas novas de que esperas mais...

E todas as verdades principais
hão-de vir-te ao caminho.E a sua vinda
é que te abre os caminhos por onde vais.

08 agosto 2007

Uma data,uma memória

Dos amigos que fomos perdendo ficaram-nos sempre alguns instantes,quase sempre fugazes, que temos a sensação de ter roubado da esteira das suas vidas e que adquiriram para nós o valor de um pequeno tesouro que, de maneira quase avarenta, vamos revisitando, recontando, para nos certificarmos de que não nos estará faltando alguma peça. Na bolsa das recordações, a morte é sempre uma mais valia ! Como me surpreendo hoje a compreender tão bem e até a corroborar opinões, conceitos e exigências daqueles que, em sua vida, julguei com dureza( ás vezes com raiva) e até combati !... Saudade,gosto amargo de infelizes... como diz o poeta.Não há datas marcadas na nossa forma de ser amigo, ou filho ,ou viuvo, mas as datas,recorrentes, quando vêm ao nosso encontro, põem-nos esse tal gosto amargo,não na boca, mas na alma. É por isso que´são bons os tais instantes roubados, flashes que dão uma luminosidade única à nossa mais tímida recordação...

04 agosto 2007

Crepúsculo

Afinal há mais abordagens e outras juventudes...E eu nunca deixo de ter novas coisas a aprender!...




1-Do poeta grego AGELLOS SIKELLIANÓS



E eu tinha os olhos cheios
mas tão cheios de luz,
que,se fechasse as pálpebras,
ela jorraria como pranto,
como pranto- abrindo-se
em flores orvalhadas.
A luz cavava sulcos
em meu cérebro,aligeirando-o
como à árvore o vento
que lhe atira os frutos
ao chão,e aí,
libertas,as folhas
frondejam nas alturas
com um novo frémito.
A luz cavava sulcos
em meu cérebro e corria-me
pelas veias,lenta,calma...

2-DO POETA JAPONÊS FUJIWARA TEIKA

Por cobertura,
quando o vento do outono entardece
na noite que espera,
a dama da Ponte da Saudade
estende o luar...



Tradutores: 1-José Paulo Paes
2-Stephen Reckert

29 julho 2007

Reflexões sobre as leituras da liturgia de hoje

Os três textos encerram lições que sempre têm “mexido” comigo de uma maneira muito peculiar, cada um por uma razão distinta. O problema da justiça nas repreensões ou mesmo punições a dar àqueles que prevaricam, podendo essa punição vir a projectar-se no todo de que o prevaricador é parte, é de facto um grande embaraço para quem se vê na contingência de ter que castigar. Na verdade, assalta-me a grande dúvida sobre apenas um conceito: a Justiça. A preocupação de Abraão quando se atreve a insistir, e insistir, e insistir, junto de Deus, sobre as hipóteses possíveis nas cidades do pecado, não é outra senão a preocupação sobre a justiça, mesmo sendo Deus a entender aplicá-la. E afinal o que aprendemos nós com a atitude de Deus? Que o que prevalece são os critérios de misericórdia e de perdão, visionando nós, como pano de fundo, os méritos da solidariedade. A possibilidade da nova oportunidade não é sequer aflorada neste episódio do Génesis mas Jesus permite-a mais tarde . “ Vai e não voltes a pecar”, além de ser uma enorme caridade é uma extraordinária prova de confiança que eu creio que ninguém teria jamais coragem de trair...E é dentro desse espírito de perdão e confiança que São Paulo vem depois dizer que nós somos todos já” ressuscitados”, considerando metaforicamente que os nossos pecados, pelos quais Jesus se deixou morrer, eram a nossa morte, antes de tão espantosa purificação. Aprendemos pois a contar com todas as benevolências divinas de tal modo que perdemos todo o pudor face ao nosso Deus e quase deixámos de saber falar-lhe porque em permanência e quase exclusivamente temos coisas a “PEDIR”.São Lucas reporta que JESUS terá estimulado os discípulos a pedir “Pedi e dar-se-vos-á” mas antes ensinou-lhes como e O que pedir, Aqui nasce a nossa oração de acesso ao Pai que nós já banalizámos tanto que quase já nos sai mais dos lábios do que do coração. Pensar, de vez em quando, em cada uma das frases do PAI-NOSSO é pois necessário ...e urgente. Porque seremos ouvidos; mas irá junta alguma parcela também do nosso Amor...

25 julho 2007

Fátima 3

Não foi nenhuma peregrinação de data, comemoração ou comunidade instituidas. Fui ontem a Fátima, primeiro porque sentia saudades de respirar o que lá se respira, depois porque me pareceu particularmente apropriado levar lá, convidadas por mim, umas pessoas especiais. Individualizando :uma amiga que me cumula de "miminhos" quase diários, formatados em bolos, bolinhos e doces e cuja viuvez recente ainda não lhe ensinou tanto quanto a minha; uma jovem mãe com a sua filha de onze anos, residentes no Rio de Janeiro há muitos anos, mas de nacionalidade portuguesa, e agora de visita à família e seus amigos, em clima de matar saudades , a mais velha, e de afivelar laços a este país tão seu quanto desconhecido, a mais nova.Para melhor dizer, esta nasceu mesmo no Rio e, tendo mantido a nacionalidade portuguesa, só agora começa a aperceber-se do que é ter uma pátria do outro lado do mar e tem curiosidades inerentes a essa realidade.Sou( o que se pode dizer com propriedade) uma velha amiga desta família, amizade que nasceu nas aulas que dei à sua terceira geração, contando desta brasileirinha para trás. Por isso, sei o quanto e o como da irreliogiosidade dos que viveram sempre aqui e maravilho-me perante a Graça de Deus que fez cristãs, crentes e praticantes, as que espiritualmente se fizeram pessoas no Brasil. E porque esta diferença existe, nunca haveria alguém da família que pensasse em avivar ou revelar locais, usos e tradições religiosos tão nossos, a estas duas portuguesinhas em visita que, por ser curta, já tinha uma programação repleta de lindas coisas,preparadas com muito amor mas onde ninguém se lembra de que a Fé é também cordão umbilical. E lá fomos nós a Fátima. O dia esteve glorioso, sem frio nem calor,sem vento e duma limpidez transparente como eu só conheço naquelas serras. Por isso mesmo, pudemos ir visitar o Calvário dos Hungaros que é o meu local preferido, fora do Santuário. Será escusado pormenorizar todo aquele dia de isto é porque... ali diz-se que...imagina que...aqui costuma ser...Percebi um enorme impacto provocado pelo conjunto de factos presenciados com o ambiente, a luz, o reboar dos sinos, a atitude das pessoas também em visita...Algo de novo surgiu aos olhos da menina e gravou naquele coraçãozinho o que a levou a dizer-me em certo momento:"Estou tão feliz !"com aquele adocicado do falar brasileiro.Nunca esteve nos meus planos fazer qualquer espécie de proselitismo de trazer por casa mas quem ficou muito feliz fui mesmo eu, porque, ao regressarmos a Lisboa, todas traziam no rosto um brilho feliz que é mais eloquente do que muitas palavras. Até a minha amiga mais velha vinha descontraída e leve. Como eu !... E para o Brasil vão voar, daqui a dias, uma, duas ou três dezenas de fotografias que mãe e filha tiraram para mostrar ao pai que não veio e não viu, ele sim brasileiro, católico, praticante, na Fé que é também Amor...

21 julho 2007

Rosalia de Castro







Que es soledad ?
Para llenar el mundo
basta a veces un solo pensamiento...

10 julho 2007

LISBOA

Lisboa à beira da barra,
Lisboa à beira de mim,
Meu rio, barco e amarra,
Ida e volta, meu sem-fim...

Minha Lisboa ! Nunca assim falei da cidade que é minha mesmo, como é convencional dizer.se da terra onde se nasceu. A minha terra é Leiria.Esta é uma realidade que endossei mas que não sinto correr.me nas veias. Pelo afecto essencial, pela aderência física, pela génese das memórias, pela imanência espiritual, pelas cumplicidades culturais, eu tenho aquela terra que me tem, plena e despreconceituosamente, e essa terra é Lisboa. Nela fui menina e mulher, nela amei, nela sofri, com ela aprendi códigos e tradições, Nela FUI.Nela ESTOU SENDO. E estou tentando acompanhá-la nas vicissitudes do seu desenvolvimento, ou, melhor dizendo, do seu crescimento. Porque Lisboa mais tem crescido,em comprimento, largura e altura, não sendo bem a isto que se chama desenvolvimento. Passando por muitas mãos executoras das ideias, opiniões, credos políticos, ou mesmo convicções de muitas cabeças pensantes, Lisboa arruinou-se, remendou-se, engalanou-se, endividou-se e continua linda a seduzir-nos com as suas claridades e os seus lusco-fuscos, com os seus altos e baixos, praças largas ou recantos esconsos, modernices ou antiguidades... Suponho que é por estas razões todas que se encarniçam os políticos quando,democraticamente, vai a votos a governação desta linda cidade-mulher( como diz aquele fado ) . Desta vez há nada menos do que doze candidatos pretendendo governá-la, cada qual acreditando que conhece o segredo de a tornar melhor, mais europeia, mais rica...diferente. Estive a ouvi-los e ficou.me um travo na garganta, uma inquietação mal definida... Que Lisboa, senhores, que LISBOA será essa, senhores, que nos querem dar, a nós que amamos esta tanto ?...

08 julho 2007

7-07-2007

É curioso como nós sentimos que, quanto mais vamos avançando na idade, menos os outros nos vão conhecendo, mas também menos nós vamos tendo necessidade de nos darmos a conhecer.
Confesso que é até um certo prazerzinho perverso o apercebermo-nos de quanto se estão a enganar a nosso respeito ao atribuirem-nos gostos, qualidades, defeitos, manias, que já poderão ter-nos qualificado alguma vez, numa vida que ficou para trás, mas que, no momento actual, tiveram a sua deriva natural e são já outros... É que se vai perdendo tanta coisa com o andar da vida, que é com uma espécie de avareza que nos resguardamos e guardamos só para nós este tesouro de, afinal, não sermos bem aquilo que eles pensam saber de nós...
Tudo isto me ocorreu agora, justamente pela contrária! Houve quem se lembrasse do meu fascínio pelos veleiros que é de sempre e, este, perdura. Levaram-me pois a vê-los, agora que se está a realizar o Campeonato do Mundo dos barcos que irão depois às Olimpíadas. Naquele mais mar que rio e ainda rio a encontrar o mar, de Cascais para o Guincho, é deslumbrante a presença das velas, a sua leveza e a sua capacidade de tornear os ventos, uns ventos ferozes, desabridos que podem ser desafio mas que também lhes podem ser indispensáveis... Todo este encantamento puramente estético da minha parte tem que ver com uma nunca satisfeia ambição de espaço aberto, de liberdade que não significa isso de que se fala e que eu creio que só quem anda no mar é que conhece.
E porque o vento era um excesso, e porque tivemos que estar sempre dentro e por detrás de vidros embaciados de sal, regressámos a outros confortos.
Tinhamos todos na cabeça a data de 7-7-2007. Uma incessante campanha produziu os seus efeitos e ninguém podia deixar de estar curioso pelo resultado de duas auscultações, uma só aos portugueses, outra a todos, de todo o Mundo, para que, sob um colossal consenso, o Mundo e o nosso país passassem a ter os seus Colossos de Rodes ou os seus Jardins suspensos de Babilónia... Uma estação de televisão fez a festa estrondosa e conheceu-se resultados no meio de muita música, muita luz, muita cor... Por acaso(seria?) uma outra estação de televisão fazia-se eco das enormes preocupações ambientais que, ameaçadoras, nos aconselham comedimento e engenho para poupar. POUPAR tudo, senão... Assim, encantada com o que me pareceu um bom prenúncio de possibilidades de entendimentos mundiais, desde que o que suscita esse entendimento seja reconhecidamente uma mais-valia para a Humanidade, não consegui contudo libertar-me da angústia de compreender que o ESPAÇO de cada um de nós está, minuto a minuto, a ficar mais restrito, sem que muitos de nós nos apercebamos disso...

30 junho 2007

Concerto nos Claustros


Uma noite de lua redonda e céu brilhante,um ventinho rasante a cheirar a mares largos e o intermitente revoar de gaivotas piando,tão perto de nós era o rio,já quase mar!... E subia na noite a estridência metálica de Gershwin e Stravinsky a enrolar-se na renda de pedra dos claustros iluminados a luz e contra-luz em tons de águas-marinhas ou esmeraldas...E quando se desdobrou o coral de vozes múltiplas,frescas,plenas,vibrantes ou simplesmente murmurantes,a complementar frases da orquestra, levando a emoção ao climax imprevisto, foram realmente momentos de puro encantamento ! Faz precisamente um ano, ouviramos ,na Sé, um lindíssimo concerto dos alunos que finalizavam o ano lectivo da Escola de Música do Conservatório Nacional e foi já um enorme prazer sensorial. Este ano, nos claustros do Mosteiro dos Jerónimos,todo o enquadramento sublimou ainda mais o inefável prazer de nos deixarmos "embeber" pelas maravilhosas interpretações e pelo interesse na coerência das peças escolhidas. Mais uma vez fico devendo todo este prazer à minha aluna Margarida que , de uma maneira muito inteligente ,está tendo uma excelente formação artística.

26 junho 2007

EXERCÍCIO DE GEOMETRIA

Está perdido por aí
Roto e cansado
O amor confiado
Que eu tinha a toda a gente
E queria ter
Só por acreditar
Num Homem linear
De que eram para crer
As formas que podíamos olhar.

Com o andar da Vida descobri
O poliedro multifacetado
Que pode ser o Homem quando olhado
Através de outros prismas diferentes
E o meu amor passou a refractar-se,
Procurando sofismas
Para dar-se...

O que porém tudo mais complicou
Foi entender, mais tarde,
Que, das três dimensões,
Grande disparidade
Havia entre o volume e a profundidade,
Entre o perímetro e a real estatura
E entre a área ocupada e a sua projecção...

Aí, meu coração peric litou.
Porque, em perplexidade,
Não sabia
Se escolhia o melhor
Quando optava
Por aquela dimensão
Que algo mais lhe dizia...
E o Amor que é cego, como se sabia,
Nas buscas e ajustes se rasgava
Ganhando ele também novas medidas,
Outras designações mais condizentes
Co’a refractada luz das ilusões perdidas
E a forma poliédrica das gentes...

24 junho 2007

Da AMIZADE( nº 2 )


Tenho ouvido muitas vezes a referência à maior ou menor capacidade de fazer amigos e até já encontrei este item em fichas de avaliação de desempenho de certos funcionários mas nunca me identifiquei com a pesquisa deste tipo de informação porque não consigo compreender a correlação de fazer com amigos ou amizade. FAZER pressupõe construir, fabricar, edificar, manufacturar e por aí fora.Também pressupõe um plano, um projecto, e não se compadece com improvisação se não enveredar pelo método das tentativas, das étapas ou das fases. Ora não é com nenhuma espécie de planificação que a minha amizade por alguém existe. Ela nasce como consequência de muitas consequências e depois desabrocha lentamente como aquelas corolas que são fotografadas por um processo especial que as acompanha no desdobrar de cada pétala muito suavemente, muito lentamente, até que a flor aparece em todo o seu esplendor...E depois vai-se cultivando, acarinhando...e é-se AMIGO, sem que tenha sido preciso fabricar nada.
Mas, porque se é amigo, é que sempre temos que fazer muitas e muitas coisas com graus de dificuldade variáveis, sempre com graus de exigência elevados.
E porque creio neste brotar da amizade, sem pretender grandes explorações metafísicas, sei que
ela é geneticamente ( ! ! !) um dom da minha alma, das nossas almas...
Já não digo um dom que Deus me deu...Mas não é que, em dia de SÃO JOÃO ( joão= dom de Deus), acabou de se abrir toda uma corola que, aos poucos andava a desdobrar as suas múltiplas pétalas ?

20 junho 2007

Exames e Férias

Saramago,Camões,Stau Monteiro,Pessoa,Gil Vicente e um cortejo de recomendações, uma inquietação de dúvidas,um sobressalto de diz-se,diz-se,amontoaram-se todos neste último fim de semana ,constituindo uma montanha que aqueles a quem eu vou chamando os meus meninos,durante mais ou menos oito meses,queriam escalar afanosamente em algumas horas.Porque o exame estava aí,porque a sua juventude só então lhes permitiu compreender a seriedade da situação,porque só então se deixaram convencer pela realidade de que um exame é sempre uma étapa nas nossas vidas( e uma étapa que permite crescer,se for vencida) . Por tudo isto e por amor a eles foi a minha tarefa mais a de tranquilizá-los do que de a de entrar com eles naquela lufa-lufa de "não sei se me lembro ", " e se fossemos ver...", "aquilo que o professor disse naquela aula...". Foram mesmo uns dias de merecermos todos alguma boa recompensa. E afinal todos saíram contentes das provas. Este ano lectivo que começara com toda aquela turbulência da célebre TLEBS, acabou por trazer umas provas acessíveis para todos, sendo que até a comunicação social se fez eco das vozes de alguns professores que acharam que a prova do 12º ano era demasiado fácil. Quanto a mim, esta facilidade é ainda uma consequência da tal turbulência do início...É bem certo que VIVER é sempre fazer política !
Mas,agora, de repente, sou eu que realizo que entrei em férias... Quem me conhece sabe que não é uma das coisas de que mais gosto...

13 junho 2007

Santo ANTÓNIO

Aqueles santos e santas cujos historiais nos são presentes e onde tão edificantes exemplos poderiamos recolher para procurar imitar, sempre representaram para mim qualquer coisa de profundamente misterioso por me ser impossível imaginar em alguém, alguma vez, um estado de perfeita pureza. Mas, admirando-os e considerando-os sem nenhuma espécie de reserva, fico sempre aquém e por fora, mais espectadora do que discípula, tomando-os como referência em tantas circunstâncias da minha vida, embora incapaz de me ver na pele deles a tomar as iniciativas que eles tomaram de despojamento, de humildade, de coragem, de abnegação... E tem-me sido dito por quem sabe que nenhum santo decidiu que o iria ser e que, de nós, entre nós, podemos alguns estar já a percorrer o caminho da santidade porque a génese dessas vrtudes radica tão somente na nossa real capacidade de amar o outro e que só nessa especialíssima forma de amar pode estar a origem de todas as virtudes que algum dia poderão ser reconhecidas.
Seja-me pois permitido confessar que me sinto especialmente enternecida perante este SANTO ANTÓNIO que Lisboa festeja com uma exuberância perfeitamente pagã,pensando nele como um rapazinho da Lisboa do século XII que, esquecido de si, fugindo ao fácil, ao confortável, ao bom para si , amou sem medida, aproximando-se dos simples, sem nunca se furtar ao cumprimento das exigências mais duras. Foi certamente por tudo isso que ele foiadoptado pelo povo que o foi sentindo sempre mais um dos seus , aqui em Portugal ou em Itália, para lhe valer em situações difíceis, fossem elas males de amor ou perdas de qualquer espécie... Até o rei D. João V mandou erigir em sua honra o espantoso Convento de Mafra, porque a ele recorrera, pedindo um filho que tardava em vir ! E não é que o alistaram no exército agradecendo a sua intercessão nas vitórias alcançadas aquando da Restauração da Independência, sendo-lhe até atribuido salário e progresso na carreira militar , o que o levou até ao posto de tenente-coronel, por ordem de mais do que um dos nossos reis ?!
E é a esse inefável místico de cujo quarto irradiou uma noite, já perto da sua morte, uma luminosidade deslumbrante( dito por quem espreitou e viu) porque ele tinha nos braços , vivo, o pequenino Menino Jesus, é a ele que o povo reza o RESPONSO quando perde e quer achar um objecto qualquer e escreve quadras brejeiras por causa dos namorados, e ergue tronos de papelão com manjericos...Quão misteriosa, a santidade ! Se até os peixes alinharam à beirinha da praia para ouvir da sua boca aquilo que os homens não queriam ouvir, como será possível não amá-lo de uma forma diferente e não dizê-lo bem alto, cantando ou mesmo dançando, se nos ultrapassa o mistério que tudo isto encerra ?...

10 junho 2007

Camões e Eu

Eis aqui, quase cume da cabeça
de Europa toda, o Reino Lusitano,
onde a terra se acaba e o mar começa
e onde Febo repousa no Oceano.

ESTA É A DITOSA PÁTRIA MINHA AMADA
à qual, se o Céu me dá que eu, sem perigo,
torne, com esta empresa já acabada,
acabe-se esta luz ali comigo.

06 junho 2007

CRIANÇAS


Creio que já afirmei com muita clareza o quanto aborreço esta cércea que se tornou sintoma de globalidade e que dá pelo nome de "o dia de ". Sem podermos ígnorá-lo, porque a poderosa máquina comercial agita a comunicação social nesse sentido, aí somos nós arrastados na onda das comemorações maiores ou menores, conforme o grau de intensidade desse tsu-nami... Chego a pensar que já ninguém prescinde desses lembretes porque dá outro sossego não ter que carregar com mais aquela preocupação :" não me posso esquecer do dia da Mãe", p. e. . E porque lá passou mais um Dia da Criança que agora, segundo creio, também acumula com mais uma ou duas dedicatórias (Já não vão chegando os dias para serem de dedicação exclusiva!), aconteceu que me afundei em comiseração por aquelas mães que agora, agora mesmo, estão a sofrer daquela espécie de amputação que é volatilizar-se-lhes, como por magia ,aquele filho que elas tinham ali agora mesmo, aquele filho que elas nem sequer puderam ver morrer, se é que morreu( será? )... E multiplicaram- se de repente casos com crianças, todos dolorosíssimos, e reavivaram-se casos de mistérios tão antigos, nunca esclarecidos, e subitamente o Mundo apareceu cheio de crianças que ...Era mesmo oportuno celebrar este tal dia? Em nome de quê ? Da esperança? Ou da desesperança ? Da dor dos pais ou do sofrimento das crianças? Porque , nunca tendo tido a Graça de ser mãe, dei em passar muito tempo a observar, a escalpelizar os procedimentos dos filhos dos outros, daqueles pequenos seres que eu achava mesmo intrigantes, misteriosos até.Percebi que, desde que nascem, as crianças vão adquirindo "humanidade"( não descobri uma palavra melhor), por aquisição de hábitos. Tal como se habituam às horas das mamadas ou das papas, habituam-se a um horário de dormidas ou dos banhinhos e também se habituam às caras, às vozes, aos braços que as envolvem, aos beijos e carinhos dos que lhes são próximos. E nós, adultos, achamos que esse habituar-se é já afecto. Mas quando será que realmente nascem os afectos ? Os afectos puros, aqueles que não advêm do físico, que não podem relacionar-se com qualquer tipo de proveito, poderão acontecer ainda antes daquelas idades em que choram, no silêncio dos seus quartinhos, quando sonham ou imaginam que se separam do Pai ou da Mãe ? O mundo infantil, da pureza sempre ingénua, afectiva, límpida e generosa é pura ficção dos adultos. A única diferença entre, por exemplo, os ressentimentos e aversões infantis e os dos adultos reside no facto de, nas crianças, tudo ser deveras pouco duradouro. No entanto, se solicitadas por causas idênticas, sempre podem repetir-se com igual ou superior intensidade e requinte as suas manifestações negativas. Parece-me que a criança não odeia, não tem capacidade de elaborar uma pulsão de ódio, mas é capaz de persistir numa qualquer rejeição com violenta persistência. E é também capaz de criar e utilizar métodos para imposição da sua vontade, perfeitamente por si mesma catalogados, desde cenas de gritos e lágrimas escandalosas, em público, às manifestações de histeria com repercussões desastrosas para todos os envolvidos. Embora as suas reacções sejam espontâneas, do seu íntimo podem brotar manifestações de um ego interesseiro e calculista que ela sabe manejar com uma mestria insuspeitável . Exibe uns ademanes naturais, uns olhares oblíquos ou velados, uns sorrisos aliciadores, em espantosos joguinhos de sedução que a nós, adultos, ou divertem ou enternecem, levando-nos a pensar mas quem lhe ensinaria isto? Também nos "a propósito" de certas conversas embora saibamos que são puramente imitativos, denunciam as crianças uma espantosa capacidade de associação, muito mais precoce do que nós imaginamos. E , ao vê-las actuar nos primeiríssimos tempos das suas relações em sociedade, damos connosco a pensar como ela é esperta e inteligente! E entramos gostosamente nos seus esquemas carregados de charme mas, misteriosamente, quão cheios já de duplas intenções ! É claro que, pela vida fora, tudo se vai aprimorando pela educação, pelos exemplos próximos , sendo que aquele ronronar que sabem fazer, como os gatinhos satisfeitos, se vai transformando em palavras, e se vai moldando até pelo habitat.
Cabe aos adultos estar atentos, ser hábeis junto das crianças, nunca se permitindo certo tipo de manipulações que as adulterariam e, de genuinas que são, passariam a ser apenas crueis arremedos de gente grande.
Por isto tudo, nesta efeméride deste ano, com os acontecimentos que nos têm horrorizado, eu não poderia deixar de partilhar a amargura sem remédio das pobres mães, mas dos meus pensamentos não consigo afastar a perspectiva de sofrimentos de tantas crianças, por me parecer que sei adivinhar nelas mais essa misteriosa capacidade de sofrer, na sua forma tão peculiar, sendo infantil... Mas as crianças, Senhor, porque lhes dais tanta dor ?

04 junho 2007

De Eugénio de Andrade

Apenas um rumor

E no teu rosto aberto sobre o mar
Cada palavra era apenas o rumor
De um bando de gaivotas a passar...


Despedida

Colhe
Todo o oiro do dia
Na haste mais alta
Da melancolia...


Sobre a casa

Não há senão a casa viva do olhar
À beira do crepúsculo.
Não há senão
A vereda quase triste das palavras..


Palavras

Que fizeste das palavras?
Que contas darás tu dessas vogais
De um azul tão apaziguado?

E das consoantes, que lhes dirás,
Ardendo entre o fulgor
Das laranjas e o sol dos cavalos?

Que lhes dirás, quando
Te perguntarem pelas minúsculas
Sementes que te confiaram?

02 junho 2007

Seriam sessenta anos

Há sessenta anos contados hora a hora, era também, como hoje, uma bela manhã de sol. Em casa, todos nos levantámos cedo
A nossa casa, Avenidas Novas, fins dos anos trinta, era grande,com quartos e salas espaçosos acompanhados pelo longo corredor,cozinha ao fundo, casa de jantar à direita, guarda- vento
de vidro craquelé com batentes de mola a resguardar a zona da entrada e das salas"de receber".
Mas existia apenas uma única casa de banho. Havia quarto de "criadas" mas não era hábito fazer-se mais do que uma casa de banho...
Dizia eu que, naquele dia ,todos em casa começámos a movimentarmo-nos cedo, segundo um horário fixado no sentido de a casa de banho ficar absolutamente livre a partir das onze horas.
E porquê? Porque era essa a hora em que alguém viria armar sobre os meus fartos cabelos o
vaporoso e simbólico véu de noiva cingido pelo seu diadema de flores e botões de laranjeira...
Sim ! Era o dia do meu casamento !
Um pouco antes das onze horas, já vestira a saia do meu lindíssimo vestido, composto de duas peças em seda moirée,quase branca, quase pérola. A saia, direita à frente, abria atrás,sobre a cintura, aquilo que, em linguagem de costura, se chama um "macho"e que depois ia abrindo em
múltiplas pregas que davam roda à saia e formavam,por fim, a cauda.Sobre isto, havia o casaquinho, muito justo,todo ele abotoado,até ao remate do pescoço, desde a cintura, por dezenas de pequeníssimos botões, tal como as mangas, com botõesinhos desde a mão até ao cotovelo.Foi um trabalhão para abotoar tanto botão, mas era uma coisa muito vieux-style que
eu adorava,tal como o enorme laço que ,na aba do casaquinho,atrás, dava a ideia de que as pregas que iam formar a cauda se despenhavam dali, como se de uma cascata se tratasse...
Mas ,a estas horas, já a casa começara a encher-se de amigos e pessoas de família, uns que nos acompanhariam à Igreja, outros que vinham só para ver "a menina",tais como todas as vendedeiras "freguesas"( naquele tempo iam vender-nos tudo a casa, desde o peixe à fruta), as criadas já reformadas e as empregaditas das lojinhas próximas. Havia entretanto um crescendo de enormes arranjos de flores,por todos os cantos.Como era moda da época,fazia-se a exposição dos presentes recebidos: eram as "corbeilles".Para isso se destinava uma das salas devidamente decorada e fora preciso estudar e criar espaços de circulação tal como também na sala de jantar,porque os chamados "copos de água"nessa época, eram servidos e feitos em casa.Essa também uma razão para a mistura de cheiros e perfumes que se esgueirava por todos os cantos da casa, juntamente com pessoas em corridinhas que abriam e fechavam portas...
Estava programado que eu sairia para a Igreja ao meio dia e quarenta e cinco e,ao meio dia certo, chegou o meu ramo de noiva, um bouquet de açucenas fresquíssimas que pareciam acabadas de colher. A minha Mãe apareceu deslumbrante num vestido preto,longo e muito drapeado, e com uma capeline preta guarnecida de plumas de vários tons de verde-água,muito esvoaçantes. E lá veio o meu Pai, lindo na sua farda de gala,com espada e tudo...
Como não se sabia sequer que um dia viria a existir uma coisa chamada telemóvel, não houve comunicações nervosas entre famílias de noiva e noivo .Tudo havia sido combinado, programado e rigorosamente cumprido.Alguém me disse a certa altura que o CARLOS ´já chegara à Igreja. .As nossas casas,de ambos, eram a meia dúzia de metros da Igreja de Nossa Senhora de Fátima.
Cheguei e,ao sair do carro, apercebi-me de que fazia um vento desalmado;segurei o toucado com a mão disponível, porque a outra ia agarrada ao braço do meu Pai.E, frente às escadas que tinham sido cobertas por uma passadeira vermelha,tivemos a surpresa de que o vento,incidindo de lado, enfunava cada degrau como se fosse um pequeno balão.Rapidamente a espada do meu Pai deixou de ser apenas decorativa e os dois,de braço dado ,fomos subindo degrau a degrau , tendo o meu Pai previamente aplanado com a espada cada espaço onde eu devia poisar o pé... Lá dentro, ninguém percebia porque levávamos tanto tempo a subir uma talvez dezena de degraus
O meu NOIVO ! Esguio,elegante,a envolver-me toda com o olhar e o sorriso que só eu lhe conhecia...O altar, os genufluxórios, NÓS. À nossa frente o senhor padre Augusto, franciscanonosso conselheiro,confessor e amigo;à minha esquerda os meus Pais e agora Padrinhos;à direita do noivo, o seu irmão e aVera sua mulher, seus Padrinhos.Recebemo-nos nas bençãos de Deus,no amor de Jesus,"até que a morte nos separe"...Olho,por acaso,para a esquerda e vejo escorrerem pelas faces do meuPai lágrimas grossas,silenciosas,que caíam sobre as medalhas e o azul da sua linda farda...Foi como um sinal de partida para o meu choro,soluçado, nada silencioso,que pôs o meu noivo na mais dilacerante aflição:" não estás feliz?"perguntava. E eu estava,sim,muitíssimo feliz, mas com uma nova realidade para o resto da vida:o peito manchado de lágrimas de um Pai ,elas só memória e presença de quanta pequena ou enorme coisa só por nós dois vivida na outra vida que tiveramos com AQUELA que fora o seu primeiro amor e minha MÃE,tão nova nos deixando sendo eu quase ainda bébé!Eram lágrimas só nossas, de um amor que ali mais ninguém recordaria.
Terminada a cerimónia,foi a festa,os votos dos amigos,as brincadeiras,as fotos...Sei que nada comi embora me aparecessem nas mãos vários pratos com coisas moito apetitosas que várias pessoas vinham generosamente trazer-me. Tinha sim aquilo a que se chama um nó na garganta, de felicidade, de emoção,de coração a transbordar de amores diversos...
Saímos,por fim.Ia começar finalmente a "nossa" vida !
Do "Ficarmos sós", claro que não se conta, porque é o secreto património de encantamento a que na vida todos temos direito.

30 maio 2007

50 anos de Televisão

A nossa televisão oficial fez,a seu tempo, uma enorme comemoração pelos seus cinquenta anos de existência e, quase de forma institiva, nós, os que a vimos nascer, os que esperámos por ela com um certo entusiasmo e muita expectativa, comemorámos com ela muita coisa que, nas nossas vidas, começou logo, logo, a estar-lhe relacionado, quer por coincidência de datas, quer por aquisição de novos hábitos, quer por, preto no branco, nos aparecerem ali visíveis, quase palpáveis, coisas por nós sonhadas, imaginadas, ambicionadas e, pensávamos nós ,ínalcançáveis.
Mas alegrava-nos, em todas as suas revelações, às vezes trazia-nos mesmo coisas para fazer rir, muito ingénuas , óbvias, simplórias até, algumas vezes brejeiras, sem grandes pretensões, segundo creio.Era a televisão das famílias simples. E tinha publicidade, pois tinha, com slogans musicais que mais ou menos todos iamos cantarolando de cor : "candeeiros bem bonitos, cheios de cor e de brilho, só os vendem com certeza os Duartes pai e filho". Até ouvi uma vez o meu Pai a trautear isto, ele que nunca cantava ! "O senhor está constipado e ficou mal de repente, porque não teve cuidado, porque foi imprevidente..." e anunciava-se uma coisa simples, para a garganta, creio eu... Ora aí é que começa o que me leva hoje a só abrir a televisão para programas que escolho de antemão, para ver noticiários em épocas que os justificam ou para ver primeiras apresentações de novelas portuguesas para "sopesar" o seu valor ou interesse que possam justificar o continuar a vê-las ou não.A nossa televisão dos dias de hoje, ATERRORIZA-NOS .vive a meter-nos medo de quase tudo. Do conhecido e do desconhecido, do suspeitado, do provável e do improvável.No que se come, no que se bebe, no sol,na chuva, no calor e no frio, no que se anda e no que não se anda, no que se ouve, no que se olha, em tudo isto se vão descobrir perigos de aquisição de terríveis doenças, de epidemias, de alterações de ADN ,de desmultiplicações moleculares, de morte mais ou menos anunciada à la longue...No nosso país ou no fim do mundo, se alguém tiver dor de cabeça, é porque já aí vem uma endemia, uma pandemia, e vão moorrer os velhos, logo à cabeça, e os bébés talvez...E depois isto é dito e redito a todas as horas e a todos os propósitos e despropósitos, assim como uma lavagem ao cérebro...Tiram-nos a alegria de VIVER,com tais e tantas previsões e prevenções, com constantes deambulações por HOSPITAIS, com câmaras e microfones em cima de doentes vários e a escutar médicos mais ou menos insignes que só nos aconselham a ir a outros tantos médicos para ver se... Isto é um verdadeiro cerco, um ataque à nossa paz de espírito, um aliciamento à insegurança e ao medo. Que saudades daquela televisão que nos permitia chegar a casa, caír no maple preferido,`as vezes tirar os sapatos e fazer uns grunhidinhos de satisfação, esticando o corpo, alargando o sorriso e ver no écran falar da chuva ou do bom tempo, sem dramas, porque cansados de dramas já a vida de cada dia nos traz e de que maneira !
Creio que há uma ideia de que a cabeça de cada um de nós ficará leve se nos derem um binómio
de assuntos que vai desde palhaçadas sem classificação a casos de justiça puros e duros,aparentemente sem solução.E nessa convicção entram então,em vez dos hospitais, os tribunais.E lá vêm os dramas contados e recontados, e lá vem a frase "tenho comigo o sr. X que
assistiu..." E o encavacado sr.X a dizer que não era bem assim...e por aí fora. Creio que esta incidência nos casos de tribunal será para nos obrigarem a fazer exercícios de lógica, como acontecia nuns antigos programas do INSPECTOR VARATOJO...
Não há mesmo dúvida nenhuma de que estes cinquenta anos nos mudaram muito.Nós, o Mundo, a Vida... Mas, se há também coisas boas, o que me parece é que, mesmo essas, são um bocadinho menos doces...direi mesmo, mais amargas...

28 maio 2007

Se se atender às datas verificar-se-á que fiz aqui um intervalo maior do que o que é habitual nas minhas" considerações registadas".E embora os intervalos nem sempre signifiquem mudanças. este corresponde mesmo a mudanças. Decidira não continuar a pertencer àquela geração a que certa publicidade se refere dizendo que está ou quer "assapar" até por me parecer que isso não é coisa para a minha idade, e mudei para uma empresa que alia o telefone fixo de casa ao nosso computador e me parece ser uma coisa mais "à séria", como também agora se diz. E, mais económica também, o que náo é despiciendo. Só que as alterações cumpriram certas fases e depois a minha saúde resolveu também fazer pausa e pôs-me a pouco mais que pão e água por alguns dias. E, num regime desses, nem sei se se pensa, quanto mais se se escreve...
Que dá para deitar contas à vida, isso dá. E acendem-se projectores mais ou menos potentes sobre zonas também mais ou menos escuras que, no nosso ritmo diário normal de "passar por", não chegamos a encarar. É bom. Fica muita coisa muito evidente. E uma certa irritação por não termos sidos atentos, na hora certa...

19 maio 2007

Superstição?

Serei mesmo supersticiosa ? Não devo sê-lo. Não quero sê-lo. Mas ... suspeito que, mascarada com aquele apego ao que é tradicional, está mesmo a superstição,em práticas inocentes que, se as não concretizo, me deixam, no mínimo, incomodada.
Aconteceu agora, na quinta feira da Ascensão.
Todos os meus amigos conhecem já a Valentina. É mais do que aquela pessoa a quem chamamos uma empregada. É uma amiga.Toma conta de tudo aquilo que eu, a pouco e pouco, vou deixando de poder fazer e também de tudo aquilo que ela entende que me é útil, agradável, consolador, e por aí fora. É alegre, disponível, sempre atenta,porque, quando não está na minha casa, telefona, quer saber se "já não me dói", se "não quero que venha cá" etc.,etc.. Ora no Dia da Espiga,durante a manhã em que ela esteve cá em casa, nem eu, nem ela nos lembrámos desse velhíssimo "hábito" de adquirirmos um bonito ramo cheio de simbolismos, nesse dia. Quando eu mais tarde me apercebi da falta, fiquei incomodada. Mas já não podia fazer nada. Os tais raminhos, vendem-se pela manhã nas paragens de autocarro e pouco mais. Uma estranha
sensação de perda não me largava...
E não é que, às oito e tal da noite me aparece a Valentina, toda risos e divertimento, empunhando um belo ramo de Espiga e brincando comigo, como faz muitas vezes ,"desta vez a Senhora esqueceu-se mesmo !..."
Deste tão encantador gesto e da minha tão reconhecida alegria naquele momento, nasceram vastíssimos planos de interrogações que se estão ainda prolongando e me fazem reconhecer quanta coisa há para destrinçar nos nossos comportamentos afinal tão misteriosos...

15 maio 2007

Para não esquecer o meu latim

CREDO
Credo in Deum, patrem omnipotentem,creatorem caeli et terra. Et in Jesum Christum filium ejus unicum,Dominum nostrum, qui conceptus est de Spirito Sancto, natus ex Maria Virginis, passus sub Pontio Pilato,crucifixus,mortus et sepultus est; descendit ad inferos,tertia die ressurrexit a mortuis, ascendit ad caelos, sedet ad dexteram Dei Patris omnipotentis, inde venturus est judicare vivos et mortuos. Credo in Spiritum Sanctum,sanctam ecclesiam catholicam, sanctorum communionem, remissionem peccatorum, carnis ressurrectionem, vitam aeternam.Amen

13 maio 2007

Fátima

Milhares de luzes. Milhares de lenços brancos.
Cada um não podia aperceber-se da grandiosidade do conjunto.Era UM, no meio de muitos mil...
Por isso o culto da nossa religião se presta em comunidade. Por isso o nosso aprendizado fundamental é o da humildade. Por isso o nosso comportamento social é o da solidariedade.
Porque em cada UM, quanta dignidade!...

09 maio 2007

Robert Schuman e Jean Monnet

Seria uma coisa de estranhar que, havendo actualmente dias votivos para tudo, não houvesse um para celebrar esta realidade chamada EUROPA e cuja definição me parece tão difícil de elaborar. Pois é hoje, o tal DIA da EUROPA. Ouvi no noticiário da Rádio.Nunca me esqueci, nem esquecerei daquela figura carismática,sempre vestida de escuro,esguia,calva e de nariz agudo que anunciou a constituição da Comunidade do Carvão e do Aço em 1950, o senhor Robert Schuman. A Guerra ainda nos estava tão próxima, eu tinha acabado de vir de Londres onde ainda havia tantos daqueles tapumes que cercavam a enorme cratera que fora um bairro inteiro, e uns senhores chamados Schuman e Jean Monnet estavam a preocupar-se em arranjar mecanismos para fortalecimento de uma Europa onde não voltasse a ser possível acontecer tamanha calamidade.Jean Monnet congeminou mesmo a ideia de uns Estados Unidos da Europa, sendo Schuman partidário de uma política inspirada na Doutrina Social da Igreja, e Monnet o economista por excelência. Dos trabalhos de ambos foram nascendo esboços e aparecendo projectos que entusiasmaram muitos europeus. Parecia-nos que a tal realidade Europa seria a garantia da concretização de muitos sonhos. Caberá aqui falar em UTOPIA?.
Foi então no dia 9 de Maio que Schuman nos apresentou um primeiro modelo de UNIÃO,cujo texto inicial havia sido redigido por Monnet. E esta Europa que hoje temos começou por aí.
De 1950 a 2007, seria exequível manter os pressupostos de então ?

06 maio 2007

Dia da Mãe

Mãe de todas as Mães,
Nossa Senhora !

Não que para falar~te
haja um dia, uma hora,
mas hoje apenas vim para acolher-me
ás dobras do teu manto,
na dor de recordar
as Mães que não perdemos
pela saudade,
e As outras, As de agora,
deste inquietante mundo
de filhos tão dispersos
tão diversos,
( tantos cuidados, dor,
inquietações ou lágrimas de glória )
mas Filhos muito amados
teus, também...

Só por laços de amor
vim suplicar-te agora,
Mãe de todas as Mães,
Nossa Senhora !...

01 maio 2007

1º de MAIO

Veio o primeiro 1º de Maio, depois da revolução.
Uma mole imensa de povo veio para a rua, nesse dia !

Todos se falavam, muitos se abraçavam, mesmo sem nunca se terem conhecido
E riam alto, e cantavam, formando rapidamente grupos espontâneos . Surgiam de todas as direcções, sendo, no entanto, o estádio da avenida Rio de Janeiro o grande polo de atracção porque era aí que estava programada a enorme concentração, em que os dirigentes dos partidos dos “trabalhadores” iriam aparecer juntos e em pessoa para falarem àqueles cujo DIA se festejava...No entanto, era tal a multidão que, às tantas, já se não conseguia entrar sequer no estádio. E então, como lava escorrente de qualquer cratera, deslizava pelas ruas...Atravessou Lisboa, em cortejo, uma faixa da largura das avenidas, apenas com a palavra LIBERDADE preenchendo toda a sua área. Era de tal forma majestática e conduzida com tal andamento de pompa, que não havia quem não experimentasse uma certa forma de emoção, vendo-a passar.
Não houve uma briga, um desacordo, em todo aquele dia. Lágrimas sim ! Viam-se muitas em rostos de pele seca com olhos pisados e expressões tensas ; deslizavam sem controlo possível, tal como aquela LIBERDADE que parecia escorrer e ia vindo ao encontro de todos nós...

Era uma enorme emoção colectiva !
Por isso se gritavam slogans copiados de revoluções estrangeiras, na convicção de que o povo seria quem iria passar a ordenar.
O certo é que, nesse dia, ninguém pensava que, conquistada a possibilidade de se viver em democracia, os homens da Revolução , e os outros, iriam mostrar quão difícil é aprendê-la.

25 abril 2007

25 de ABRIL

...um dia, Portugal não mais aguentou e amanheceu num Abril como nunca ninguém tinha visto antes.
Quanto a mim, foi realmente uma coisa feliz, o facto de a chamada REVOLUÇÃO dos CRAVOS ter eclodido numa manhã, quando o grosso dos lisboetas se preparava já para sair de casa, para iniciar mais um dia de trabalho. Não sei como, em que altura do dia, aconteceram tantas outras revoluções no nosso país ou nos países estrangeiros, mas parece-me singularmente acertado que esta, deste nosso Abril, nos entrasse pelos quartos e pelas casas de banho, graças àquele Radio Clube Português mais uma vez metido nestas coisas de actuar sobre o acordar de uma população meio adormecida...É que, por esta circunstância, ficámos para sempre a poder falar de Abril em lindíssimas metáforas todas reportadas a esse acordar, alvorecer, nascer, começar e todos os seus sinónimos que expressassem a vontade de “partir para outra”, porque o regime já exaurira todas as capacidades de entusiasmo que, mesmo que tentássemos, já não conseguíamos de modo nenhum reactivar.

Houve então um turbilhão de coisas bonitas, a seguir a estas horas de acordar! Lisboa, a medo, apesar dos pedidos emitidos pelo Rádio Clube, foi saindo para a rua...Sabia-se que lá para a Baixa é que estava a “tropa”. Os dos bairros mais populares mais próximos pensaram logo que os soldados (“coitadinhos”!) deviam ter fome, ou não tivessem eles passado a noite em viagens...E lá foram prontamente aparecendo braços estendidos com púcaros de café a fumegar, em direcção aos soldados acastelados nos seus “chaimites”. De quem seria a ideia do que veio logo a seguir ? Teria mesmo sido a da pragmática Celeste Caeiro que, no Rossio, deu um cravo vermelho a um dos soldados que lhe pedira um cigarro que ela não tinha ?
Um cravo mais para aquele outro soldado, “ outro para si, senhor alferes!”, outro para o marinheiro, no Chiado ... e foi um mar de cravos encarnados, uma onda crescente e multiplicadora, que viria a dar um nome a esta revolução!
Iamos já nas margens do meio dia e já era por todo o lado o alarido –
Afinal era no Carmo, o centro de tudo. Lá é que estava o Salgueiro Maia (alguém também lhe dera um cravo) a confirmar-se como esteio da nossa confiança. Equilibrando-se em cima de uma árvore, o velho Sousa Tavares descobria o ponto estratégico para captar a sua reportagem tal como dezenas de outros mais novos infiltrando-se por todos os lados. Depois, a televisão veio a mostrar-nos tudo...Mas quem lá podia estar via primeiro, estava LÁ. !

Olha, olha, o Spínola entrou agora no Carmo !!!
Foi chocante, quando saiu Marcelo Caetano. Mas aí já se cantava em toda a Lisboa “Grândola vila morena, o povo é quem mais ordena " As movimentações no Terreiro do Paço e suas redondezas já chegavam ao resto da cidade como um ecoar de trovoada que se afasta...O dia foi chegando à acalmia da noite. Mas o que nunca ninguém vai poder roubar-nos é a beleza daquela manhã de sorrisos e cravos, de emoções tão novas e estimulantes. E " depois do adeus ", cantado como senha, primeiro, e depois como romântica lembrança pelo tão jovem Paulo de Carvalho, depois de "ficarmos sós", cada um em suas casas com a sua memória da Revolução, realizámos quanto agora teríamos que dar denós a este jovem país.