29 março 2009

Parábola da semente-5º domingo

Tenho sempre usado os muitos poderes da minha imaginação para me ver fazendo parte daqueles grupos que seguiam Jesus, curiosos, compreendendo pouco, mas intuindo muito, perfeitamente rendidos ao suave tom da sua fala, parecendo antes a de quem medita em voz alta, mas sendo na verdade ( e podiam tê-lo percebido por vários Sinais ) a de a quem Deus conduz como seu Filho, mesmo nas situações mais sinuosas e difíceis. Hoje, São João conta-nos da curiosidade de uns gregos, em Jerusalém, que queriam conhecer Jesus o que, de certa maneira, não deixou de preocupar os discípulos que temiam por ELE, naquele ambiente meio festivo que já atraía estrangeiros para a Festa próxima.Porém Jesus, serenamente, como se nada passasse por ELE, ensinou-lhes a parábola da semente que, se cair à terra e não morrer, estiolará numa solidão sem horizontes.Mas que,morrendo enquanto semente, poderá multiplicar-se em réplicas ad aeterno... Todos os que o ouviram sabiam,pela prática, que isto era assim, simples de entender e aceitar. Mas aquilo que ouviram a seguir e não foram capazes de perceber se era um trovão, aceitando com naturalidade que poderia ser a fala de um Anjo, nisso é que surgiu o Mistério : o Mistério de um Deus que estava ali, com eles, prestes a deixá-los até à Eternidade, e ninguém foi capaz nunca de compreender...Que era ELE mesmo a tal SEMENTE !

26 março 2009

Parafraseando Natália

«« a poesia é para comer »» dizia a Natália Correia, no seu modo estrepitoso de escandalizar... E eu, sem nenhuma vontade de escandalizar seja quem for, sempre a entendi perfeitamente e, a partir de certa época da minha vida, comecei a ousar aconchegar junto da ideia da Natália a minha de que a VIDA é para se beber... A grandes tragos ou a pequenos goles.
Aquele acontecimento de um amigo que atinge a classificação magna cum l aude na sua prova de doutoramento, ou o de uma amiga que chega de outra terra para vir ficar connosco, partilhando a nossa casa e a nossa vida temporariamente, ou a tomada de decisões práticas na ocorrência de factos imprevisíveis na orientação do condomínio, ou a envolvência carinhosa de alguém de quem não a esperávamos, ou a bonita camélia que,no nosso minúsculo jardim, a cameleira nos ofereceu, ou a senhora da paróquia que vem pedir para os seus missionários protegidos, ou aquela bonita luz difusa que este sol de primavera deixou coar através das cortinas de linho antigo que hoje lavámos, ou a aluna que nos encheu a semana com uma classificação de 19 valores, depois de termos trabalhado tanto...São, gota a gota, aquela bebida que transforma em pequenos oásis certos dias de secura, tonus indispensável para qualquer gosto de viver.A poesia de que a Natália falava ( e comia ), essa acho que é destas múltiplas gotas que acaba por brotar...

22 março 2009

Gaudete ! 4º domingo

««Naqueles dias,todos os chef.es de Judá, os sacerdotes e o povo multiplicaram as suas infidelidades, imitaram as acções abomináveis das nações pagãs e profanaram o Templo que o Senhor tinha consagrado......O Senhor, Deus de seus pais, bem cedo e sem descanso começou a enviar-lhes mensageiros... mas eles escarneciam dos mensageiros de Deus, desprezavam-lhes as palavras e troçavam dos seus profetas a tal ponto que deixou de haver remédio para a crescente indignação do Senhor contra o seu povo...
Isto nos diz o texto exrtraído do Livro das Crónicas para a missa de hoje, o chamado Domingo Gaudete. Claro se torna depois, .no restante das Leituras, que a infinita misericórdia e o grande amor de Deus pelas suas Criaturas o levou a perdoar-lhes, não sem que tivessem antes passado pela deportação e sofrimentos em Babilónia e não sem que lhes fizesse compreender a magnanimidade dessa sua mesma misericórdia que,através de Jesus, queria fazê-las trilhar os caminhos da LUZ e das BOAS OBRAS. E é dessa infinita vontade divina de nos perdoar que retiramos todas as nossas razões da alegria deste 4º domingo da Quaresma de este ano.
Fica-me para meditar,toda a semana, a citação do Livro das Crónicas e a interrogação posta ao meu espírito sobre, quanto tempo, quanta cultura, quanta experiência,quanto progresso humano poderemos medir, contar, desde o que aqui nos é narrado até aos dias que estamos vivendo hoje...

21 março 2009

Poesia

como meter o mundo
num poema? traduzir-lhe
a áspera realidade, a doçura
intranquila ?

como meter o trabalho
dos homens, os seus dias,
nessas escassas linhas,
seus ócios, seus espelhos,

seus desvarios, suas
catástrofes de amor ?
como meter a morte
nas palavras ?

só que uma coisa bela
é para sempre uma alegria inquieta.

Vasco Graça Moura

19 março 2009

PAI

São apenas uns flashes guardados na minha memória, com amor. Por isso duram.
1º- O meu Pai é um homem alto e eu, nos seus braços, quase desapareço. Ele usa uma farda acinzentada e está de pé, muito direito, aperta-me com muita força e...soluça.Algumas das suas lágrimas caem sobre o meu cabelo.Dão-nos uma flor que ele põe na minha mão e inclina-se...É a minha mãosita que vai pousar aquela flor sobre um montão de tule branco sob o qual a minha Mãe parece ter adormecido...
2º-O meu Pai espera-me, cá fora, à porta da Faculdade. Eu não me apercebera de que ele estivera lá. Abraçamo-nos, na minha surpresa do encontro. Alguém diz a "graça" do momento: «Aqui temos a nossa doutora!» O meu Pai põe as suas grandes e tranquilizantes mãos sobre os meus dois ombros, olha-me bem de frente e diz, quase para ser só eu a ouvir : «doutora sim,filha, mas nunca esqueças que, primeiro que tudo, és UMA SENHORA »...
3º-Estamos frente ao altar-mor da Igreja. Eu, noiva dos pés à cabeça, por dentro e por fora, toda feliz.Á minha esquerda o meu Pai ,brilhante, na sua farda azul com lindas medalhas no peito, a seu lado a minha Mãe com uma lindíssima capeline preta enfeitada de plumas verdes. Do meu lado direito, o meu adorado noivo, todo nervoso dentro de um fraque que nunca gostou de vestir, e à direita dele o seu irmão e cunhada.Portanto, tudo nos seus lugares para começar a celebração do meu casamento. Era um dia de Junho,muito ventoso e, para subirmos a escada da Igreja, o vento levantava a passadeira que deviamos pisar e o meu Pai ia aplanando degrau a degrau com a sua espada numa das mãos enquanto com a outra me segurava braço para que não me desiquilibrasse...A cerimónia, as orações, a alocução para os noivos pelo Sr. Padre Augusto, tudo uma beleza. Lembro-me de olhar para o meu Pai...O peito da sua bonita farda azul, por entre as tais medalhas, parecia cheio de nódoas. Pela sua cara deslisavam ,silenciosas e grossas, lágrimas que me destroçaram, fazendo-me chorar também...

A saudade de um Pai é tecida de malhas muito miudinhas que nunca perdem o seu significado ao longo de qualquer vida, mesmo longa...

15 março 2009

Depois da tempestade a bonança possível...

Imaginemos que saio desta espécie de túnel negro por onde me têm trazido esta semana as dores nunca antes experimentadas de uma inflamação nas espondilíticas cervicais, que resolveram envolver-me desde os mais recônditos locais da minha cabeça ( nem eu sabia que haveria por ali tanto cantinho para doer ! ) Imaginemos que já estou outra vez de bem com o meu computador e que a minha cabeça já se vai aguentando na posição que ele lhe exige..
Então aqui vou eu pensar ( será que não vai doer? ) neste 3º domingo de quaresma, tão especialmente cheio de interpelações, que chego a crer vir também ele pleno da especial atenção com que o Senhor este ano me atribuiu a minha penitência quaresmal.
Em primeiro lugar, vemo-nos como que acareados com"três" interlocutores diferentes. Muito diferentes mesmoNo Livro do Êxodo, é o Senhor Deus que fala àquela turba humana que acabara de salvar de uma humilhante escravidão e que, vencidos tantos obstáculos só superáveis porque existiu a Sua ajuda,iria agora, eufórica, entregue a si mesma fazer o quê ? Sem "rei nem lei",como se diz, e sem a mínima noção de como se é povo, sem vícios ou fraquezas humanas ( não cobiçarás a casa, nem o boi, nem o criado, nem a mulher do teu vizinho..! ) Bem, o Senhor Deus acaba mesmo criando um código e é com uma certa dureza que tudo faz para que entendam a importância de observá-lo EU SOU UM DEUS CIOSO. castigo a ofensa dos pais nos filhos,netos e bisnetos daqueles que me detestem, mas sou benevolente com os que me amam e guardam os meus mandamentos. E assim aquela massa humana seguiu na procura de um entendimento nada fácil, então. NUNCA, tenho vontade de o dizer agora. Todo este ideal seria realmente uma loucura de Deus ? Surge-nos então o segundo interlocutor, o "apaixonado" São Paulo a lembrar-nos aquela pertinente noção das distâncias que vão de homem para Deus e que estamos constantemente a esquecer.: « o que é loucura de Deus é mais sábio do que os homens e o que é fraqeza de Deus é mais forte...»» Por isso mesmo é que tanto se fala naquela " fúria" de Jesus ( o nosso terceiro interlocutor de hoje ) ,quando,suponho que gritando e esbracejando correu com os vendilhões do Templo. Foi isto uma sua fraqueza ou uma sua força ? Na linha de quanto há dois mil anos era necessário fazer para ser compreendido,terá sido uma força. Para que o"fraco" HOMEM não precisasse, dois mil anos depois ,ainda , de ser lembrado daquilo que todos sabemos lhe falta: a noção de que, cobiçar o boi ou o criado do seu semelhante e ver neles apenas o chorudo possível negócio, fará de si mesmo um " vendilhão" sem alma, sem Amor, que Jesus voltará a expulsar do TEMPLO.E de que a pertença a um povo, e para mais "de Deus",lhe exige discernimento para uma solidariedade / caridade que não se coadunam com qualquer "banca" de vendas no átrio de qualquer templo...

10 março 2009

SE..

Se...Vou iniciar este meu post por um SE... Foi o2º domingo da quaresma .Quanto me seria grato ter mais uma vez subido ao Monte Tabor e naquela amplidão de vista, naquela leveza de respiração, ter podido ficar à espera de ouvir e ver este é o meu filho muito amado... Mais uma vez não consegui armar a minha tenda. Por isso digo SE. Se Deus quer realmente alguma coisa de mim, estou a ser posta à prova como poucas vezes o tenho sido. No meu físico, muito. No meu espiritual, imenso.
Até aconteceu naquele mais um dia das coisas todas que há, ser o Dia da Mulher.Não tenho muita simpatia por estes dias que separam grupos .Porém este 8 de Março... Fez agora, nesse dia, 32 anos que eu entrei definitivamente na Função Pública voltando costas ás escolas,ao ensino oficial. Comissão Instaladora de algo de onde só viria a sair já reformada... Era de celebrar. Neste dia que me traz um cacho de recordações espantosas, apenas quis o Senhor meu Deus que conseguisse uma lágrima ...ou mais... Se com o Amor as entendeu decerto as aceitou, preito de coisas que só NÓS sabemos...

01 março 2009

1º Domingo de Quaresma

«Naquele tempo o ESPÍRITO SANTO impeliu Jesus para o deserto » Começamos assim o nosso primeiro Evangelho da Quaresma deste ano. Deste ano tão particularmente comprometido pela mão do Homem, tão desprotegido materialmente, tão desertificado espiritualmente. Creio firmemente que, tal como o fez com o Filho de Deus/ filho do Homem, o Espírito Santo nos está impelindo para o deserto, a nós Homens com quem, até há algum tempo, procurou estabelecer um Arco-Iris, sinal de aliança , como prometeu na hora do Génesis... Resta agora para nós discernir se as tentações a que Jesus esteve sujeito e foi vencendo durante apenas aqueles quarenta dias, tal como o próprio deserto, de que nos conta São Marcos , não serão reduções exponenciais e exemplificativas daquilo para que , vista a quase imperdoabilidade do nosso caso, o Espírito Santo nos esteja a impelir. Será então de pensarmos no que poderemos ainda fazer, nós Homens, para, reaprendida a disciplina moral, penitentes ainda, mas de cara levantada, sairmos por aí a dizer « arrependei-vos e acreditai...» Teremos ainda Coração e Amor bastantes para curar tantas situações de sofrimento ?...