25 junho 2011

Serão na noite de São João

Na passada segunda-feira respirei, ao serão, finalmente, o ar livre daquelas inquietações que nunca consigo deixar de sentir quando os meus meninos vão fazer os seus exames finais. Agora os exames estão feitos e eu ...em férias. Tive este ano pela primeira vez na minha história de professora uma aluna classificada com 20 valores na minha Literatura ! Isto não é vulgar e merece ser explicado. Ela foi,desde sempre, uma aluna brilhante do Colégio Alemão. Nunca precisou de explicações, mas estudou segundo os programas daquele Colégio que, segundo agora soube, não integram Literatura portuguesa. Mas, ao chegarem ao final dos finais, têm que fazer uma prova ORAL dessa matéria, o que no meu entendimento será como uma conexão ao país onde o curso foi desenvolvido. E assim ela veio pedir-me a ajuda necessária para, nesse finalizar de um brilhante percurso, não fazer má figura. Trabalhámos muito,sendo ela realmente alguém com quem dá prazer trabalhar, pela aplicação, pelo afinco, pelo discernimento, pela curiosidade, pelo interesse...Enfim, os JURADOS entenderam dar-lhe 20 valores e eu sei bem que ela os mereceu. Em final de história, vale a pena notar que o Colégio a classificou depois no total do 12º ano também com vinte valores e ainda lhe ofereceu como prémio uma bolsa de estudo que a vai levar agora por um ano para a Alemanha.

E todo este registo aqui surgiu quando eu me abeirei deste teclado na disposição única de falar de São João, por ter visto no principio do meu serão uns delirantes festejos em honra do santo, transmitidos do Porto pela televisão. Como é realmente verdade que a escrita toma conta de nõs e nos dá o rumo, quando menos esperamos ! Mas assalta-me uma espécie de "vergonha" por me ter acontecido tal coisa logo com São João que gritava no deserto que deviamos abandonar as nossas fraquezas, concentrar-nos na certeza de que Deus estava a chegar,sendo humildes e devotos... Vejo-o um quase gigante, imbuído daquilo que profetizava e realmente tão pouco ouvido então . Como agora em tais festanças ! Que derivas se têm dado nas nossas cabeças para não pensarmos nos gafanhotos que ele comia no deserto, quando abancamos a beber vinho e a comer sardinhas em sua honra ?

19 junho 2011

CASAMENTO

Naqueles dias Moisés levantou-se muito cedo e, conforme o Senhor lhe ordenara, subiu ao monte SINAI levando nas mãos duas placas de pedra...( Livro do Êxodo) Estou a ver-me, amiga das madrugadas cedinho, sem barulhos e ainda pardacentas, subrepticiamente a esgueirar-me atrás de Moisés,«o que iria ele fazer ?» e depois aquela nuvem, aquela conversa... Estou a ver-me,... Quem dera ! Subi sim já tão dentro da protecção da Santíssima Trindade, tão grata ao "meu" Espírito Santo, subi ontem a longa nave central do Mosteiro dos Jerónimos engalanada de flores brancas e frescas, e assisti, testemunhei, a união pelo casamento de dois jovens que do seu amor quiseram isso mesmo: que muitos amigos testemunhassem e com eles invocassem as bençãos da Santíssima Trindade para a sua vida a dois, a partir dali... Quão felizes todos ! Mães, Pais, Avós, Amigos... E a vaga dos cânticos soleníssimos a envolver-nos numa espécie de mágica que brotava das gargantas do Choir Voces Celestes transportava-nos por vezes aos tais altos montes - quem sabe? - dos que subia Moisés naquela mesma manhãsinha, ficando ao cuidado dos altos sacerdotes celebrantes o recordar-nos de quanto teremos que subir ainda e mesmo sempre...

13 junho 2011





Santo António de Lisboa
Era um grande pregador,
Mas é por ser SANTO ANTÓNIO
que as moças lhe têm amor.

De FERNANDO PESSOA



Imagem digitalizada retirada do Album comemorativo do 750º aniversário da morte do Santo,publicado em 1982.

12 junho 2011

Pentecostes

«Partos, Medos, Elamitas, habitantes da Mesopotâmia e da Capadócia, do Ponto e da Ásia, da Frígia e da Panfília, do Egipto...»(Actos 2,1). A minha língua é a minha pátria...(FPessoa) O silêncio é de ouro mas a palavra é de prata - provérbio chinês.
Desde que o mundo é mundo, é oferecida ao Homem a espantosa capacidade de comunicar o que lhe vai na alma, desde os quatro cantos do mundo, em todas as latitudes, desçam-lhe ou não sobre a cabeça umas invisíveis línguas de fogo. O espírito de Deus pairava sobre as águas como nos lembramos, do Génesis, e depois tudo foi tomando forma de irmos sendo criaturas a sabermos coabitar... Pois no que diz respeito à mais completa capacidade de coabitação que é a expressão sonora do que em nós é imaterial, viu Deus que isso teria que ser uma vez mais obra do seu Espírito e o fez pairar sobre nossas cabeças com os atributos que a cada um ajudariam de forma adequada. Para mim tenho que não é só uma a descida do Espírito Santo para este fim e que vai havendo um Pentecostes para cada um de nós... Por isso é que procurei pôr os meus "talentos" a funcionar nesta área dos entendimentos com o meu semelhante...

10 junho 2011

10 de Junho

Ó mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de PORTUGAL !...
Não, não vou por aí...

O PORTUGAL futuro é um país
aonde o puro pássaro é possível
e sobre o leito negro do asfalto da estrada
as profundas crianças desenharão a giz
esse peixe da infância que vem na enxurrada
e me parece que se chama sável
Mas desenhem elas o que desenharem
é essa a forma do meu país
e chamem elas o que lhe chamarem
portugal será e lá serei feliz
Poderá ser pequeno como este
ter a oeste o mar e a espanha a leste
tudo nele será novo desde os ramos `a raiz
À sombra dos plátanos as crianças dançarão
e a avenida que houver à beira-mar
pode o tempo mudar será verão
Gostaria de ouvir as horas no relógio da matriz
mas isso era o passado e podia ser duro
edificar sobre ele o portugal futuro

De RUY BELO - O Portugal futuro

08 junho 2011

Diário versus Blog ?

Foto retirada da Revista brasileira Manchete que publicou em vasta reportagem as primeiras eleições realizadas em Portugal depois do 25 de Abril, para a eleição da Assembleia Constituinte, em Maio de 1975.



Quando era rapariga, daquela idade em que certos romances e filmes mostram ou deixam supôr meninas sentadas, provavelmente a horas certas de cada dia, a escrever «meu querido diário...», eu tive sempre a desconfiança de que esses pontos de partida ou mananciais de "emocionantes acontecimentos", correspondessem a uma qualquer realidade. É verdade que uma adolescente tem naturalmente uma intensa chama deVida sempre a crepitar dentro de si, ateada pelas novidades, as surpresas, os sonhos e as respectivas decepções ou materializações, e quantas vezes tudo isto é caldeado em descobertas inconfessáveis a exigirem um ou uma confidente... sendo então o«meu querido diário...»o único possível. Mas não é menos verdade que o tempo, o recato, a tranquilidade, que certamente eram o que eram, na vida de uma menina dos séculos das minhas avós e dos romancistas em que estou a pensar, não foram mais da mesma forma desde o alvorecer do século XX. Eu desconfiava, como disse, porque, na minha organizção de vida, nunca me vi com espaço (tempo?) para me dedicar a esse exercício sentimento-mental-digestivo-depurativo. Talvez por causa disso virei, nesta idade terceira, em sõfrega degustadora dos silêncios e dos papéis...
Quando, eis senão quando, explode, na minha própria casa, mesmo na minha mesa de trabalho,esta coisa espantosa e absorvente chamada COMPUTADOR ! Com todo o seu séquito de coisas novas com nomes novos, com uma cartilha nova, até com uma ética nova...
Curiosamente,começamos com ele e relativamente à função social do Diário que era intimista e secreto, a inverter todo esse tipo de qualidades, pois o computador como que nos atira para o meio da multidão e o que nele escrevermos pode chegar a todo o Mundo.Mas há a enorme sedução de que, por ele, todo o Mundo passou a poder entrar na nossa intimidade e por ele podemos saber muito mais de tudo, de tudo mesmo, e então ganhamos a apetência de crescer, de ir tão longe quanto possível, de correr atrás do possível leitor, porque começamos a perceber, por comparação, quanto temos para dizer, pessoas do Mundo, já não só eu, esta aqui, no cantinho destas coordenadas...
E falo de mim ou do meu país ou do meu Deus. Falo sim. E às vezes é mesmo um Diário Que eu sei estar a ser lido algures onde eu-pessoa nunca chegarei...
Aquele lindo casamento de amigos ,numa igreja de fulgurante Barroco,a abrir-se, numa tarde doirada, sobre uma panorãmica Lisboa a escorrer para o Tejo, quem iria falar dele senão eu que era certamente a pessoa com menos tarefas a cumprir naquelas ocasiões? E há uma tia no Brasil e um irmão na Polónia que vão poder ler isto que fala dos seus, tão longe !
Haverá muitas vezes um ecoar distante de coisas repetidas, como por exemplo o que se pode dizer de umas renhidas eleições que fazem mudar completamente o cariz das regras que nos vão conduzir e que tão gravosas se nos apresentam, desde o último domingo em que fomos todos marcar com um pequeno signo aquilo que gostaríamos talvez de não ter que marcar.Se faço esta observação é apenas porque o ter que nos dá uma marca de obrigação a que ,tantos anos passados sobre as primeiras eleições por mim vividas quase em festa, não desejaría ninguém ver-se compelido .
Isto tudo faz parte desta nova maneira de ter um «meu querido diário...» Só que estamos no Mundo e é século XXI ... Alguém reconheceria na foto de 1975 (cabelos tornados pretos pela idade do papel da Revista recortada) a cabeça que, desde então, continua sonhando sonhos do tempo dessa iniciação cívico-política, se não existisse este moderno repositório de memórias?

05 junho 2011

Ascenção

... elevou-se à vista deles e uma nuvem escondeu-O a seus olhos.( Actos dos Apóstolos)
Tão simples quanto isto !
E cá ficámos nós a imaginar pela enésima vez a situação. o acontecimento, tentando sem sucesso entender, porque não é alcançável pelo nosso entendimento, pelo menos enquanto estivermos aqui, fora da tal nuvem ...
Dos mistérios da minha religião, este é um dos mais belos, o mais artisticamente depurado, o mais suave, o que nos abre caminhos para Cima, para uma outra Luz.. Talvez o que torna mais autêntico tudo o que quer dizer a palavra ESPERANÇA...
(excerto do meu livro como não tendes Fé?)

03 junho 2011

ONTEM

Foi ontem o Dia da Espiga. Da alegria pagã sobre a fertilidade dos campos até à colagem cristã pela alegria com a maturação da crença na presença de Deus entre os homens, na pessoa de Jesus, porque neste dia os discípulos bem O viram elevar-se e desaparecer no céu, como fruto já suficientemente amadurecido neste território, destas alegrias se gerou a alegria da ASCENÇÃO. O povo entronizou a espiga como simbolo da sua sustentação em pão, mas não deixou de reconhecer em cada oferta da Terra, mesmo nas mais humildes florinhas, um valor simbólico desta alegria de estar vivo, sendo povo desse Deus que com ele até conviveu...
E assim na 5ª feira da Ascenção ia-se dantes colher no campo o raminho de símbolos coloridos e alegres; e como predominavam as espigas, aí nasceu o nome comum dado a este dia.
Se se chegaria a estas colheitas com grandes canseiras,( hoje, nas cidades, compra-se tudo já pronto), se era com sacrificio físico que se encontrava cada símbolo, não sei de história que o conte e não o sei de experiência. Mas não sei e não soube responder a alguém que me perguntou« porque é que "espiga" é sinónimo de coisa enfadonha ou difícil de suportar ?»
Não encontrei documentação que explique esta deriva semântica, mas vou continuar procurando e também deduzindo... Por agora, mantendo a tradição tenho na minha frente o colorido raminho.Também simbolicamente desejo para o povo de Deus, nesta situação tão preocupante deste ano, a verdadeira, sólida, espiga que aqui deixo...

02 junho 2011

2-6-1947



Era ! Era de açucenas brancas o meu ramo de casar. Dezenas delas.

Recordo os riscos amarelos que os seus estames traçavam nas roupas de quem quer que viesse abraçar-me... E um perfumesinho irrepetível...

Ficaram lá, aos pés da imagem de Nossa Senhora. Uma fé, uma acção de graças, uma promessa,tantas esperanças !

Ficaram.

Foi há 64 anos .